tag:blogger.com,1999:blog-12124251257047978322024-03-05T19:52:26.201+00:00MaranosFilosofia PortuguesaUnknownnoreply@blogger.comBlogger49125tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-18760755545706591662008-01-27T19:44:00.001+00:002008-12-09T02:24:30.576+00:00Despedidas<blockquote><p> </p><p> </p></blockquote><br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj7ICInkbqjKC615e-U2msetCYb_udTG9F7lizOFrhxBC1KFQ_FcJT_Py7Q5Xh6HoY5da3chePz8ML_eTz4ZnazQfkLGOXn7tkDdNQgpicVIpW8PeckSeJUS9bvsuUlp5LroweH9p8jd2U3/s1600-h/António+Carneiro.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5160245331004719106" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj7ICInkbqjKC615e-U2msetCYb_udTG9F7lizOFrhxBC1KFQ_FcJT_Py7Q5Xh6HoY5da3chePz8ML_eTz4ZnazQfkLGOXn7tkDdNQgpicVIpW8PeckSeJUS9bvsuUlp5LroweH9p8jd2U3/s320/Ant%C3%B3nio+Carneiro.jpg" border="0" /></a><br /><div align="center">O "Maranos" fica por aqui.<br /></div><blockquote><p align="center"></p></blockquote><div align="center">A todos os leitores, a nossa gratidão.<br /></div><blockquote><p align="center"></p></blockquote><div align="center">Até sempre.</div>Unknownnoreply@blogger.com8tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-70073252664492623352008-01-14T18:18:00.000+00:002008-01-15T07:50:08.873+00:00Pretextos (7)<div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="font-size:180%;">O que sabem as mães sobre seus filhos?<br /></span></strong><br /><strong><span style="color:#999900;">Pedro Martins</span></strong><br /><br />A amizade atenta de <a href="http://sesimbra.blogspot.com/">João Aldeia</a> fez-me chegar às mãos um livro de Caetano Veloso recentemente publicado em Portugal pelas Quasi Edições. Tem por título <em>O Mundo Não é Chato</em> e recolhe inúmeros dispersos do cantor baiano. A edição portuguesa preservou saborosamente a grafia do Português que se escreve no Brasil, oferecendo formal desmentido à tão propalada necessidade dessa rasoira nefasta que se chama Acordo Ortográfico.<br /><br />Previamente, o João chamou-me a atenção para um certo escrito, que é o texto de uma conferência proferida no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro em 1993. Nele, a dada altura, Caetano Veloso alude à sua passagem por Portugal, em 1969, rumo ao exílio em Londres, narrando o encontro em que, acompanhado por seu amigo Roberto Pinho, lhe foi dado conhecer em Sesimbra “um senhor português que cuidava do castelo medieval da colina e era tido como alquimista”. A este propósito, diz ainda lembrar-se “de umas ovelhas de chifres revirados, que se punham perto do velho, como se fossem animais de estimação. E do mar muito azul rodeando de longe as muralhas de pedra”.<br /><br />O velho junto dos animais era, evidentemente, Rafael Monteiro, o legendário sesimbrense que, a despeito de, ao tempo, não haver ainda dobrado o cabo dos cinquentenários, se impunha já, na sua figura hierática, com as barbas austeras de um patriarca.<br /><br />Caetano conta, então, haver cantado, ou talvez recitado, a Rafael, por sugestão de Roberto, o poema da célebre canção <em>Tropicália</em>, um dos hinos do movimento tropicalista, que o músico encabeçava. Rafael escutou o trecho, de imediata significação revolucionária, e de pronto o interpretou num outro e mais elevado sentido, conferindo-lhe, palavra por palavra, uma dimensão mística, profética e messiânica, com que assinava um fado radiante ao Brasil futuro.<br /><br />Meio surpreso, e esboçando suaves protestos, logo Caetano pretendeu restituir ao sentido original a canção da sua lavra. Debalde o fez, pois o suposto velho do castelo medieval da colina, em sua sabedoria dúctil, lhe recordou com uma pergunta a fundamental liberdade que razoavelmente assiste a todo o intérprete da palavra alheia: “O que sabem as mães sobre seus filhos?”<br /><br />No decurso revoluteante da sua prosa garrida, Caetano firma em Agostinho da Silva o traço de união com que liga os circunstantes daquele encontro. Curiosamente, não o faz passar por António Telmo, amigo comum a Rafael e a Roberto, por aqueles dias já regressado de Brasília, em cuja universidade leccionara a convite de Agostinho, e vivendo, então, em casa voltada a Sul, no sopé do morro onde o castelo de Sesimbra se alcandora. Certo é, na mesma altura, Caetano Veloso, na companhia circunspecta de um sorridente Gilberto Gil, ter também visitado António Telmo em Sesimbra. Prazenteira, fluida, cordata, a conversa entre o cantor brasileiro e o então novel filósofo de <em>Arte Poética</em> deixou entrever possíveis afinidades.<br /><br />Na conferência proferida no museu carioca, agora recolhida nas páginas de <em>O Mundo Não é Chato</em>, Caetano, que não deixa de se questionar sobre uma possível missão brasileira à face do orbe, mostra-se avesso à via do misticismo. Não obstante, reconhece-lhe o sortilégio de uma sedução que, no seu dizer, lhe vem da excentricidade. E, para mais, mostra compreender como poucos a grandeza inteira de um poema maior como a <em>Mensagem</em> de Fernando Pessoa, que abertamente faz sobrelevar às poesias ortónimas, às odes de Álvaro de Campos e aos poemas de João Cabral de Melo Neto, o seu poeta favorito, e o mais extensamente lido. “Com <em>Mensagem</em>”, acrescenta o cantor, “eu me sentia em presença de algo mais profundo quanto a tratar com as palavras – por causa de cada sílaba, cada som, cada sugestão de idéia parecer estar ali como uma necessidade de existência mesma da língua portuguesa: como se aqueles poemas fossem fundadores da língua ou sua justificação final”.<br /><br />Necessariamente diverso, o sebastianismo hesitante de Caetano Veloso denota natural suspicácia perante Ariano Suassuna, “um inimigo mortal do tropicalismo”. Mas talvez se encontre uma oitava acima da tibieza daquele professor português de literatura que o cantor, com discreta reserva, nos apresenta como uma “autoridade em história das relações entre modernismo brasileiro e modernismo português”, e a quem ouviu a confissão de um infundado temor inicial, entretanto desmentido, a respeito de Agostinho da Silva: o de que as suas ideias se identificassem com as de Salazar!<br /><br />É certo que Caetano, tomado pelo receio de que o culto dos mitos medievais possa servir “de inspiração para extremados nacionalismos modernos”, não está livre de interpretar algumas “afirmações instigantes” de Suassuna à luz da frase famosa com que Salazar preferia ver Portugal pobre do que ver Portugal diferente. Mas a seu favor depõe a circunstância de intuir num poema da <em>Mensagem</em>, qual esse que Pessoa intitulou de “Os Colombos”, a grandeza que supera toda a inferioridade ao propor uma “transcendência da mágoa”.<br /><br />Ficamos sem saber o que pensava do livro tradicional de Pessoa o tal especialista lusitano versado em modernismos de que o cantor nos fala. Mas sabemos, de ciência certa, o que dessa obra genial pensam hoje, contra todas as evidências, não poucos literatos portugueses. Caetano, o brasileiro que outrora deixou por responder a sábia pergunta de Rafael, veio agora mostrar-nos aquilo que os filhos podem saber sobre suas mães. </span></div>Unknownnoreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-12219508386908617862008-01-13T23:17:00.000+00:002008-01-14T10:12:59.029+00:00AFORISMOS SOBRE PORTUGAL (2)<strong><span style="font-family:trebuchet ms;color:#999900;"><blockquote><strong><span style="font-family:trebuchet ms;color:#999900;"></span></strong></blockquote><p></p><blockquote></blockquote><div align="justify"></div><div align="justify">Eduardo Aroso </span></strong></div><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"></div></span><span style="font-family:trebuchet ms;"><blockquote><p align="justify"></p></blockquote><p align="justify"></p><p align="justify"></p><p align="justify">8. A indiferença jamais tocará a costa de qualquer ponto cardeal; nunca apertará a mão ao nosso semelhante, para lavrar futuras rotas do mapa-mundo. A indiferença jamais saberá que a Terra é redonda.<br /><br />9. Há fragas no litoral que lembram quilhas de embarcações estáticas. Mas basta que a flor do sonho nasça, no silêncio prenhe de toda a intuição que há na pureza do orvalho nocturno, para haver fome do céu. E nesta ânsia, no que nos cabe de indeterminismo do nosso sagrado instinto civilizacional, a procura é o feixe quântico de todos os rumos do espírito.<br /><br />10. Nós pelos outros; nunca nós por apenas nós. Está é a divisa pela qual poderíamos definir a ideia mais ampla de portugalidade. O que assim não for poderá dar lugar a alguma forma de desintegração, a uma cinzenta formatação de ideias de pseudo internacionalismos, ou até fortalecer alguma subtil forma de absorção pelos nossos vizinhos. Se a verdade a vemos como ilusão, na indecisão entre a face externa e o lado de dentro, poderemos admitir ou não, qualquer dia, um outro 1640.<br />Mas não deverá ser necessário outro Tratado de Tordesilhas, porque, para ir às «Índias do Espírito», parece não haver vizinhos por concorrentes...<br /><br />11. Nos extremos raianos dos actos rígidos decretados e das rotundas da banalidade onde se cultivam torres de Babel, para além dessa fronteira, começa Portugal.<br /><br />12. Os nossos olhos deixaram de ver longe, com lucidez, quando se voltaram para um ponto fixo, demasiado fixo. Vimos em demasia a cor e o preço da pimenta, e quantas vezes rejeitámos a temperança, embriagando-nos com o cheiro da especiaria. Aí criámos cataratas que importa retirar.<br />O nosso mandala deve ser o círculo, ou melhor, a esfera. Nos tempos em que se pressentiu que a fortuna poderia vir a desfazer-se, e quando vimos em demasia o caminho fatídico de expulsão de quem já morava no nosso coração, ainda assim, a melhor herança foi a esfera armilar, para nos lembrar da necessidade quotidiana de olhar o mundo. Diz-se na teoria do mandala que, até que tudo se harmonize, não se deve fixar ponto algum. O olhar deve ser uma totalidade. Só depois encontraremos o ponto central ou, se quisermos, alguma revelação. Em geografia somos periféricos. Espiritualmente, só nos podemos realizar no centro do mundo. Do lado de fora, há que olhar ainda a linha do horizonte.<br /><br />13. <em>«Se não é eleito, que se eleja!»</em> Foi assim que Agostinho da Silva respondeu à pergunta habitual de quem geralmente cultiva meias-verdades sobre o nosso destino colectivo. Com rompante intuição, ou com sabedoria história, ou o Janus bifronte, o autor de <em>Reflexão </em>teria meditado naquele ponto tão enigmático como misterioso tem sido Ourique: o nosso primeiro Rei, ele próprio se armou cavaleiro, isto é, elegeu-se!<br /><br />14. Constituição Europeia – a esfinge clonada. </span></p>Eduardo Arosohttp://www.blogger.com/profile/11423972330372506768noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-6843493327240898202008-01-13T11:12:00.000+00:002008-12-09T02:24:30.750+00:00Escaparate (5)<div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="font-size:180%;"><strong><em><span style="color:#999900;">Os Três Frades <span style="font-size:100%;">e outros textos de ficção</span></span></em><span style="font-size:100%;">,</span> de Sampaio Bruno</strong></span><br /><br /><strong><span style="color:#999900;">Pedro Martins</span></strong><br /><br />A Imprensa Nacional – Casa da Moeda iniciou recentemente a publicação dos dispersos de Sampaio Bruno com a edição de <em>Os Três Frades e outros textos de ficção</em>. Trata-se uma recolha de escritos ficcionais da juventude, vindos a lume em diversos títulos da imprensa portuense, que não podem deixar de nos impressionar, seja pela imaginação quase prodigiosa com que o jovem Bruno urde e arquitecta a trama narrativa, seja pelo domínio irrepreensível do idioma, pouco menos do que impensável num autor que dá os seus primeiros passos ainda com 14 anos, mas que o leitor não deixará de reconhecer.</span> <blockquote></blockquote><br /><blockquote><p><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5154918344807865922" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj3y7ZFXs_1vAXEn8b46RxpluzXROdYjPKshvvFe_MksQAFauZUlX6JZWX1bFq7MiUc7ltPZKxCQU40lVviJPDPhMdZbmgcPr2egPK0sCnV8DCLf7AR1ZgvIU7yiv8LhFDCDw7iJoSD0rUs/s320/os+tr%C3%AAs+frades.jpg" border="0" /></p></blockquote></div><br /><p align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;">O que em Bruno era espantosa precocidade teve de pagar tributo a uma imaturidade inevitável. Os cinco títulos agora compilados são obras inacabadas, que se traduzem, as mais das vezes, em esboços e fragmentos. A única que apresenta envergadura considerável é precisamente a que dá título ao volume e nela perpassa um anticlericalismo feroz e extremo, que realça até à disformidade caricatural os piores defeitos de um clero profundamente reaccionário. Bem evidentes são as ressonâncias da dilacerante guerra civil oitocentista, que não deixaram de calar fundo no espírito sequioso de verdade, justiça e paz que José Pereira de Sampaio sempre foi. Tomando partido óbvio pelo campo liberal para execrar as hostes miguelistas, o narrador de <em>Os Três Frades</em>, enredado que surge na agonia cruciante de um debate, não mais do que aparente, entre o bem e o mal, faz, por um lado, adivinhar proximamente o escritor de <em>Análise da Crença Cristã</em>, (o livro de estreia de Bruno, vindo a lume em 1874), mas permite, por outro, entrever, na lonjura da distância, o metafísico teodiceico d’<em>A Ideia de Deus</em> e o pensador messianista d’<em>O Encoberto</em>.<br /><br />Virá a propósito aqui recordar José Marinho, porventura o intérprete mais lúcido deste filósofo heterodoxo e saturnino. Começando por considerar que nenhum outro pensador português terá, como Bruno, chegado a conclusões tão diferentes do ponto de partida, não deixa, porém, Marinho de acrescentar que, “entre aquilo de que parte e aquilo a que chega há, certamente, nexo íntimo”, pois, “com o contraste de aparência, subsiste vínculo profundo”. Lembramo-nos então de António Telmo, quando aponta ao erro do socialismo a verdade de uma luz refractada. O caso de Bruno foi, afinal, o de saber ver mais alto. </span></p><p></p>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-18351280197090215362008-01-12T18:03:00.001+00:002008-12-09T02:24:30.885+00:00ENIGMA<div align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><div align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><div align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><br /><div align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiZuov_2WQqAB8_97FGjalmGBBcoysrk6K6SDxhiiUxKto8MBbsC5ysiTLjUb6pPAS5BVnRLcSboOjqHbxiEKtXcUwXsmSA7Ele5cqx5JgQP2EuMPQyjgPwASP3L0W3ehk5gBkpiMS1NADU/s1600-h/bb_lusiadas.bmp"></a></span></div><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiqnyav90g8L-V-gLFwG6yeYJbNIEO3KG2nCY1KtdjjBcf8oYAcBXFN1oTizO2aPu8A1FngY2cjnEol3NqJHitKfDkwFsHRvAFDimuZV_hNaUEXAz01ds4kTqyO9nb2j9LOXXicVhprk4Dd/s1600-h/sem+título.bmp"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5154687846797991474" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 147px; CURSOR: hand; HEIGHT: 224px" height="320" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiqnyav90g8L-V-gLFwG6yeYJbNIEO3KG2nCY1KtdjjBcf8oYAcBXFN1oTizO2aPu8A1FngY2cjnEol3NqJHitKfDkwFsHRvAFDimuZV_hNaUEXAz01ds4kTqyO9nb2j9LOXXicVhprk4Dd/s320/sem+t%C3%ADtulo.bmp" width="194" border="0" /></a><br /><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><span style="font-family:trebuchet ms;"><p align="justify"><span style="color:#000000;">Luís de Camões, n’<em>Os Lusíadas</em>, conta a história de Portugal desde o início até D. Sebastião. Não fala em D. João III e no Cardeal D. Henrique. São as excepções. Porquê?<br /></span><br /><strong><span style="color:#999900;">Tomé Natanael</span></strong></span></p>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-20944823935307983052008-01-05T19:20:00.000+00:002008-01-14T10:13:36.253+00:00AFORISMOS SOBRE PORTUGAL (1)<blockquote></blockquote><blockquote></blockquote><p></p><strong><span style="color:#999900;"><blockquote><strong><span style="color:#999900;"></span></strong></blockquote><p align="justify"></p><blockquote></blockquote><blockquote></blockquote><p></p><p></p><blockquote></blockquote><blockquote></blockquote><p></p><p></p><blockquote></blockquote><p></p><p></p><blockquote></blockquote><span style="font-family:trebuchet ms;"><blockquote><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></blockquote><blockquote></blockquote><p></p><blockquote></blockquote><p>Eduardo Aroso</span></span></strong></p><p align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;">1. Inês de Castro só depois de morta reinou para sempre. E Portugal? Degolado pela inveja (última palavra de <em>Os Lusíadas</em>) no seu verdadeiro amor, não será também pátria, mito e arquétipo, só depois da fatalidade, ocorrida ou ainda a verificar-se? Ergamos-lhe o território sem delimitações de alma; o trono assente no coração do povo; na representação dos hemiciclos, ou ciclos da verdade, em discussão universal.<br /><br />2. A saudade é o milagre do concreto. Lembrar-se é ser arrastado para a verdade de algo que já foi, ou de um dia longínquo ainda, e que se sabe ser também certo.<br /><br />3. “Portugal”. É com aspas que se tem lavrado o nome, no sagrado solo do decorrer do tempo. Retiremos as aspas com que se tem escrito Portugal. Elas não vêm de cima, do céu, mas dos térreos baixios, como as ervas daninhas e musgosas que sobem pelas paredes dos espaços abandonados onde não habita viva alma.<br /><br />4. A ciência - a materialista, entenda-se - é uma mística iludida. A moderna obsessão dos nossos governantes pelas estatísticas é uma espécie de remorso pela falta de virtudes.<br /><br />5. O conjunto de todos aqueles que pensam a pátria é, sem necessidade de demonstrações históricas, o Portugal virtual ou aquele que ronda o arquétipo. Por isto se deduz, pela via contrária, que na sociedade actual possa haver o Portugal efémero.<br /><br />6. Não sei se a memória distante é a mais nítida. É, porém, a mais duradoura.<br /><br />7. Em <em>Lusofilias</em>, de Paulo Ferreira da Cunha (obra que já tardava), o autor, citando Pedro Moura e Sá, escreve: «... A nossa situação actual no mundo nos permite falar de Europa, porque não contribuímos em nada para a destruir. Por erros tremendos ou em virtude de circunstâncias trágicas, quase todas as nações do nosso continente se viram envolvidas na luta e na destruição. Portugal não tem remorsos perante a Europa, porque nada fez contra ela».<br />Também o Brasil nunca se incomodou muito com guerras. </span></p>Eduardo Arosohttp://www.blogger.com/profile/11423972330372506768noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-83636253490130842442008-01-04T12:38:00.000+00:002008-01-04T13:32:12.537+00:00Pretextos (6)<div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="font-size:180%;">Elogio da dúvida</span><br /></strong><br /><strong><span style="color:#999900;">Pedro Martins</span></strong><br /><br />Lê-se no <em>Diário de Notícias</em> de hoje que “o petróleo barato acabou”. Trata-se de uma opinião, não de uma notícia. As opiniões produzem, por natureza, um efeito calmante em quem as ouve ou em quem as lê. O positivismo sempre teve a virtude de recusar sofísticas: prefere o facto, o que está feito.<br /><br />Mas a opinião do jornal é a opinião de um jornalista, imerso em notícias. Um dia, porventura não muito distante, as notícias poderão ser diferentes. Por exemplo: “o petróleo acabou”. Por enquanto, e segundo o nosso plumitivo, os áugures da ciência do mando entrevêem uma quebra irremediável na produção da substância, alcançado que foi o pico da extracção do crude. E o jornalista acrescenta: <em>“a partir daí podem imaginar-se todos os perigos para a civilização mundial como a conhecemos hoje – toda baseada no petróleo – em guerra por um escasso bem essencial”</em>.<br /><br />Ao fazer cair o pano sobre o seu <em>São Paulo</em>, Pascoaes, confessadamente, mal pode esperar por esses dias do fim, que serão também os de um outro princípio: <em>“Esta civilização americana depende de materiais esgotáveis ou em quantidade limitada. A fábrica, esse templo moderno, há-de ser destruída, como o templo de Artemisa, em Éfeso, e o de Vénus, em Pafos. Templo quer dizer túmulo, casa dos mortos, que os mortos foram os primeiros deuses. Foram eles que dirigiram, para além do mundo, a atenção dos vivos. Destruída a fábrica pagã, teremos a igreja de Cristo, a confraria dos irmãos, o convívio universal e amoroso”</em>.<br /><br />Diferentemente do jornalista, não teve o poeta de esperar pelas notícias. A lucidez dos vates pode sempre ser explicada, mas quase nunca é compreendida. Diferentemente do jornalista, Pascoaes não lamentava perder a civilização em que vivia, afinal em tudo idêntica à “civilização mundial como a conhecemos hoje”. Ainda numa das derradeiras páginas do <em>São Paulo</em>, o escritor descreve-a pelo seguinte modo: “<em>Nesta orgia industrial moderna, paródia em ferro e vapor, da orgia pagã, o homem está morto ou isolado do seu espírito. Existe, mas não vive. Existe a duzentos quilómetros à hora, mas com a vida parada, dentro dele. Vida inerte numa existência delirante. Seduzido pelo ruído e movimento, as duas faces desta civilização americana ou neo-neroniana, integrou-se num sistema mecânico industrial, e é simplesmente uma engrenagem. O ideal da ciência é a morte absoluta; a morte da alma e a do corpo: ateísmo e milinite”</em>.<br /><br />Um dia, já no Inverno da vida do mestre, António Telmo e Rafael Monteiro foram visitar Almada Negreiros. Em dado momento da conversa, quando se falava da velha Sesimbra e da moderna praga do turismo, o pintor elogiou superlativamente a beleza natural das paisagens que rodeiam a vila piscatória: “Sesimbra é tão bela que nem uma bomba atómica a pode destruir”. Irreverente, Rafael Monteiro apressou-se a acrescentar: “Que venha então a bomba atómica, para se acabar de vez com o turismo!”. Tal como Pascoaes, poeta que lia e admirava, Rafael ansiava por um novo começo. Nada sabemos desse recomeço, o que não pode deixar de nos angustiar. Mas é também a dúvida que sustenta a esperança. </span></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-26283950867651126282008-01-01T18:54:00.000+00:002008-12-09T02:24:31.216+00:00Escaparate (4)<div align="justify"><strong><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="font-size:180%;">Quando o Senhor andava pelo mundo…<br /></span><span style="COLOR: rgb(102,102,102);font-size:85%;" >Sobre o <em><span style="COLOR: rgb(153,153,0)">Jesus Cristo em Lisboa</span></em>, </span></span></strong></div><div align="justify"><strong><span style="COLOR: rgb(102,102,102);font-family:trebuchet ms;font-size:85%;" >de Raul Brandão e Teixeira de Pascoaes</span></strong><span style="font-size:85%;"><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="COLOR: rgb(102,102,102)"><br /></span><br /></span></span><strong><span style="COLOR: rgb(153,153,0)"><span style="font-family:trebuchet ms;">Pedro Martins </span><blockquote></blockquote><blockquote><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></blockquote><blockquote><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></blockquote></span></strong></div><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;">(texto </span><a href="http://novaaguia.blogspot.com/2008/01/quando-o-senhor-andava-pelo-mundo.html"><span style="font-family:trebuchet ms;">igualmente publicado</span></a><span style="font-family:trebuchet ms;"> no blogue </span><a href="http://novaaguia.blogspot.com/"><span style="font-family:trebuchet ms;">Nova Águia</span></a><span style="font-family:trebuchet ms;">)</span></div><div align="justify"><br /></div><strong><span style="COLOR: rgb(204,153,51)"><blockquote><span style="COLOR: rgb(204,153,51);font-family:trebuchet ms;" ></span></blockquote><div style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;font-size:130%;color:#cc9933;"><strong>1.</strong></span><span style="font-family:trebuchet ms;"> A recente reedição, com a chancela habitual da Assírio & Alvim, da peça teatral <em>Jesus Cristo em Lisboa</em>, uma tragicomédia em sete quadros, originalmente publicada em 1927, e que é o fruto singular de uma parceria proveitosamente firmada, nos anos 20 do século passado, entre Raul Brandão e Teixeira de Pascoaes, veio permitir a redescoberta de um título algo esquecido nas bibliografias de ambos. Ao estigma deste olvido não terá sido estranho o facto de quase nunca a peça ter sido levada à cena, tendo mesmo ficado por representar logo nas suas primícias. Com efeito, não chegou a realizar-se o desejo dos autores de a verem subir ao palco do Teatro Nacional de D. Maria II, e para tanto terá pesado sobremaneira a crítica acérrima à classe política que a obra veicula (na verdade, são os políticos portugueses os algozes do regressado Jesus), tanto mais que se estava no período inaugural da Ditadura Militar instaurada pelo golpe de 28 de Maio de 1926, antecâmara do salazarismo.</span></div><blockquote></blockquote><p align="justify"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5150583777913396754" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 161px; HEIGHT: 238px; TEXT-ALIGN: center" height="258" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjsJGJeriTd6oZgqGUGx_ShkQyo85K9VqlUmlR3F-CQUMtyZKXl7ZpEDh6ItutuKS3qjkK0XijL9srriB3uBJM1E9wlMjCNP-rUcALWuNu0tR92UDYwAbaurnQKzPZ3xC9umfZ76Rr59_h4/s320/200711071520150.jesus.jpg" width="208" border="0" /></p><blockquote></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">Ficamo-lo a saber pelo notabilíssimo trabalho editorial de Pinharanda Gomes, que além de ter reunido, para a presente edição, um acervo documental, tendencialmente exaustivo, que permite avaliar a recepção da obra, nos oferece ainda, em posfácio intitulado <em>Jesus Cristo em Lisboa, Um Auto Messiânico</em>, um aturado ensaio sobre a tragicomédia. No conjunto, são noventa páginas adicionais com preciosos informes, indispensáveis à melhor compreensão do auto de Brandão e Pascoaes. Um traço saliente que emerge da sua leitura é o respeitante à celeuma que o livro desencadeou junto de alguns círculos católicos, como os que eram representados pelo jornal <em>A Voz</em>, um diário da capital em cuja edição de 24 de Janeiro de 1928 surge inserta violenta notícia sobre o <em>Jesus Cristo em Lisboa</em>. Nela se previne os leitores “de que o livro dos Srs. Pascoaes e Brandão não deve ser comprado nem lido pelos católicos”. O escrito, em que se transcreve parte de um artigo publicado, na véspera, no <em>Diário de Lisboa</em>, chega a ser insultuoso para os dois escritores (a quem se atribui, pasme-se, um estado de <em>acentuada decadência</em>!).</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">Pascoaes não gostou, e escreveu de imediato ao periódico católico. Poucos dias depois, dará a resposta devida ao <em>Diário de Lisboa</em>, já subscrita também por Raul Brandão. A tónica que perpassa as duas reacções pode resumir-se nisto: não há na peça o menor ataque a qualquer dogma da Igreja, antes o intuito de acordar o espírito cristão no meio social. Não é heresia representar Jesus num trabalho literário, como o não é pintar ou esculpir a figura de Cristo.</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">A verdade é que não se vislumbram sinais heréticos neste livro admirável. Não será de crer que dois dos mais poderosos criadores literários portugueses do século XX tenham amiúde e insistentemente citado trechos dos Evangelhos (sobretudo do de Mateus, mas também dos restantes) para encobrirem supostas carências da sua imaginação. A pertinácia com que as personagens de Pascoaes e Brandão actualizam, pela palavra ou pelo gesto, as passagens do Novo Testamento, parece radicar no propósito preciso de colocar a acção dramática em perfeita conformidade com os ensinamentos de Cristo.<br /><br /><strong><span style="COLOR: rgb(204,153,51);font-size:130%;" >2.</span></strong> Mas a evidente ortodoxia desta obra não significa, porém, que nela se deixe de questionar seriamente a Igreja Católica – ao contrário do que em diferentes momentos foi sendo aventado. No meu entendimento, os instantes finais do primeiro quadro, em que Jesus e um pároco de aldeia se interpelam mutuamente, e todo o quinto quadro, passado na catedral de Lisboa (e que parece ser da exclusiva lavra de Pascoaes), são, a este propósito, bem mais significativos do que, um tanto apressadamente, e a uma primeira impressão, se possa julgar.</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">No quadro inicial da peça, passado na serra, o acolhimento de Jesus no seio de uma cozinha aldeã onde se encontram vários jornaleiros não pode deixar de surpreender: este homem não sabe <em>salvar</em> e os seus dizeres são estranhos, mas também sublimes e, por isso, as suas palavras arrebatam os pobres. Chamado a intervir pela dona da casa, o reitor local faz notar a Jesus que não entrou na igreja, ao passar pela estrada, ao que o Redentor lhe responde ter <em>rezado, no caminho, a seu Pai que vê tudo o que se passa e nos dará a paga</em>. Que o regressado Cristo, não se tendo ainda manifestado como tal, comece por ignorar ostensivamente a “sua” Igreja, antepondo ao culto institucional uma pessoalíssima visão da relação do homem com o divino, é, já de si, circunstância muito significativa, que há-de ser ponderada à luz da matriz priscilianista que confessadamente condiciona o pensamento de Pascoaes.</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">Acto contínuo, o sacerdote dirá a Jesus já ter visto que ele <em>fala muito e sabe demais</em>; que <em>certas cousas não se fizeram para todos os homens</em>; e que ele é um <em>pobre soberbo</em>. Mas, quase de seguida, Jesus, segundo nos mostra a indicação cénica, chama o sacerdote, “atrai-o a si, fala-lhe ao ouvido e deixa-o atónito, a encará-lo”. Acabou, por certo, de lhe dizer algo com que revelou, para além da dúvida, a sua divina identidade. Percebe-se que o padre vacila, mas, interpondo-se no seu caminho, acaba por impedir os pobres aldeões de acompanharem o Redentor. Vale a pena transcrever toda a fala do reitor:</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">“Nem um passo! <em>E diante do ímpeto para a porta que Jesus transpôs atira-lhes com o escabelo de mesa para as pernas</em>. Ninguém sai! Então, eu baptizo-vos, eu caso-vos, eu acompanho-vos na vida e na morte, a vocês, às vossas mulheres e aos vossos filhos – levo-vos com os olhos fechados, através desta vida, e vocês querem-me deixar por ele? <em>Sobe os degraus, abre os braços diante do grupo, que estaca na arremetida</em>: Aqui não passa ninguém!”</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">Pouco depois, no final do quadro, o sacerdote, “sempre à porta, deixando cair os braços”, dirá, muito significativamente:</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">“Por vossa causa meti talvez a alma no inferno”.</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">Na sua singeleza, tão breve quanto aparente, o episódio do recontro entre o reitor e Jesus reveste-se de uma dimensão tremenda. De um lado, o apelo exaltante e libertário a uma experiência religiosa permanentemente vivida na pureza das coisas essenciais, que nos é feito por Jesus, e que convoca o lastro priscilianista, joaquimita e franciscano patente sobretudo na obra de Pascoaes; do outro, o irresistível apego mundano do sacerdote à segurança confortável de uma rotina mecânica e degradante, mas agora já inquinado por uma má consciência perturbadora, que dá a imediata medida da decadência. Essa má consciência não diverge essencialmente do incómodo que, calculista ou sincero, iremos reencontrar na mulher do comissário da polícia (no segundo quadro) ou nos políticos (reunidos no quarto quadro) que, a final, decidem matar Jesus. Não há diferença de natureza, ou sequer de grau; apenas a projecção de um enfoque privilegiado sobre uma determinada classe, porventura por razões tácticas, decerto inconfessáveis a quem o curso dos anos ensinara a prudência das serpentes como regra de vida.</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">Com efeito, a dificuldade invencível do reitor provinciano em deixar partir as suas ovelhas, e em deixar ele mesmo o redil em que as encerra, é a mesma afinal confessada por um dos ministros que vamos surpreender reunidos no quarto quadro da peça: Jesus, reconhecido como o Cristo, “terá talvez razão; está talvez na verdade; mas a verdade absoluta não pertence às regiões inferiores”, pois “o mundo, para ser o que é, não pode viver da verdade”. “E este mundo, como ele é, pertence-nos a nós defendê-lo”, acrescentará terminantemente o político.</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">No primeiro quadro, o pároco de aldeia, tendo embora reconhecido no <em>pobre soberbo</em> a pessoa de Cristo, e não podendo ignorar que neste é que está a verdade, resigna-se, porém, a defender o seu pequeno mundo, confinado aos horizontes estreitos da sua paróquia, de forma a preservar a parcela de poder que esta lhe confere – ainda que, com isso, possa conscientemente perder a sua alma. De igual modo, no quarto quadro, o chefe dos ministros, reconhecendo tratar-se – “com certeza!” – de Jesus Cristo, afirma, porém, a necessidade da sua eliminação: “Meus senhores, a verdade é esta: nós não podemos com o que Ele quer. De toda a maneira, temos de nos arriscar, sabendo mesmo que perdemos a nossa alma”.</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="FONT-WEIGHT: normal">Como se acabou de ver, no fundo, nada separa a Igreja, representada por um dos seus provincianos ministros, dos políticos que, em Lisboa, formam o ministério. A atitude do reitor no primeiro quadro da peça pode bem ser ilustrada pela afirmação desesperada de um dos políticos da capital: “Não. Temos de defender o mundo que criámos, temos de o defender até contra Deus!”. Inarredável, topamos sempre com o mesmo obstáculo: a mensagem de Cristo é sobre-humana.</span><br /><br /><span style="FONT-WEIGHT: normal"><strong><span style="font-size:130%;color:#cc9933;">3.</span></strong> Radicado embora em premissas diferentes das conclusões a que, mais tarde, acabei por chegar em O Anjo e a Sombra – Teixeira de Pascoaes e a Filosofia Portuguesa, considerou António Cândido Franco ser o </span><em style="FONT-WEIGHT: normal">Regresso ao Paraíso</em><span style="FONT-WEIGHT: normal"> o livro de Pascoaes “que melhor age, pelo menos ao nível dos valores soteriológicos, com o publicado em 1927” (</span><em style="FONT-WEIGHT: normal">A Literatura de Teixeira de Pascoaes</em><span style="FONT-WEIGHT: normal">, p. 369). A asserção parece-me justíssima e, na ligação que estabelece, permite acentuar a vertente de crítica ao catolicismo romano que esta peça escrita a quatro mãos verdadeiramente contém.</span></span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;">Perigoso será deitarmo-nos a adivinhar qual o significado encerrado na circunstância de, em toda a peça de Brandão e Pascoaes, o Diabo apenas se manifestar no quinto quadro, justamente passado na catedral, e em cujo final Jesus será entregue aos soldados, que entram na igreja para o prenderem. É na casa do Senhor que Satã, posto à solta, dá largas às suas palavras, numa sucessão de cenas em que, se exceptuarmos uma fala estranhamente desgarrada e anódina, não se vislumbra a presença de qualquer sacerdote! Para tanto, o Diabo, figurado numa escultura de altar, desenrosca-se previamente dos pés de São Miguel e vem para junto de Jesus Cristo, precipitando uma sequência de estranhos diálogos, ora bizarros, ora fecundos.</span></p><blockquote style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)"><p align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></p></blockquote><p style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,0)" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="FONT-WEIGHT: normal">Retomando a pista facultada por António Cândido Franco, curioso será notar que a harmonia vislumbrada no </span><em style="FONT-WEIGHT: normal">Regresso ao Paraíso</em><span style="FONT-WEIGHT: normal"> – no poema de 1912, o triunfo do Deus Infante mais não é do que a vitória do Arcanjo da Saudade, Metraton, ou Mikäel, sobre o tenebroso Samaël – nos surge agora subitamente quebrada no </span><em style="FONT-WEIGHT: normal">Jesus Cristo em Lisboa</em><span style="FONT-WEIGHT: normal">, tão certo é o Diabo deixar de estar sob o jugo do Arcanjo São Miguel. Na leitura cabalística e paraclética que propus em </span><em style="FONT-WEIGHT: normal">O Anjo e a Sombra</em><span style="FONT-WEIGHT: normal">, não me limitei a ver nesta harmonização dos contrários a superação sefirótica do dualismo entre o bem e o mal. Integrei-a numa interpretação que desoculta no poema uma representação alegórica do advento da Idade do Espírito Santo, num quadro de referências em que, na esteira de Henry Corbin, Álvaro Ribeiro ou António Telmo, o esoterismo cristão de Dante e seus sequazes nos leva a alcançar surpreendentes conclusões. Uma delas, evocando </span><em style="FONT-WEIGHT: normal">A Divina Comédia</em><span style="FONT-WEIGHT: normal"> e o arrojo hermenêutico de Gabriel Rosseti, permite descobrir a Igreja de Roma simbolizada no Inferno engendrado por Pascoaes. Dito isto, o leitor saberá </span><em style="FONT-WEIGHT: normal">somar dois mais dois</em><span style="FONT-WEIGHT: normal">.</span> </span></p><span style="font-family:trebuchet ms;"><blockquote><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></blockquote></span><p style="FONT-WEIGHT: bold" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)"><strong><span style="font-size:130%;color:#cc9933;">4.</span></strong> Em rigor, o <em>Jesus Cristo em Lisboa</em> não pode ser interpretado à margem do <em>D. Carlos</em>, o outro livro dramático que Pascoaes assinou, e que, de algum modo, lhe é contemporâneo (concluído em 1919, foi publicado em 1925). As <em>coincidências estrutivas</em> que os irmanam são surpreendentes: um regicídio e um deicídio, ambos tendo por palco o Terreiro do Paço, símbolo do nefasto iluminismo pombalino. </span></span></p><p style="FONT-WEIGHT: bold" align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Emergindo no estertor da Primeira República, e, portanto, numa época de arrependimento e desilusão, estas duas peças oferecem o contraponto a esse superior díptico formado pelo </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Marános</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)"> e pelo </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Regresso ao Paraíso</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">, com que, na hora luminosa do entusiasmo renascentista, Pascoaes, calibrando o trilho escatológico pela gnose da Saudade, pretendia vincular a sorte do mundo ao destino messiânico da pátria. A esta luz, o </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Jesus Cristo em Lisboa</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)"> e o </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">D. Carlos</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)"> são obras de síntese, que, pela mediação dos longos poemas míticos de 1911 e 1912, não deixam de reflectir matricialmente o deicídio aflorado n'</span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">A Velhice do Padre Eterno</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)"> e o regicídio implícito na </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Pátria</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)"> e nos poemas menores (</span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">A Marcha do Ódio</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">; </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Finis Patriae</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">) que lhe são adjacentes. A diferença está toda nisto: a mocidade paraclética do Deus Infante, que nasce no </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Marános</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)"> para, no </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Regresso ao Paraíso</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">, viver da morte de Jeová, não obsta à conversão católica (se não lograda, ao menos desejada) de Junqueiro, sugerida no quinto quadro da peça que Pascoaes compôs com Brandão. De igual sorte, o criacionismo saudosista do </span><em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">Marános</em> <span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">nada pôde contra o remorso de um vate que, como nenhum outro, experimentou na</span> <em style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">metáfora assassina</em><span style="COLOR: rgb(0,0,0)"> </span><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">o poder desmedido da palavra, para aqui retomarmos a feliz expressão de António Cândido Franco. Bem se compreende que houvesse de ser um outro poeta a remir-lhe a culpa. Por isso, e para isso, compôs Pascoaes o <em>D. Carlos</em><span style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)">, </span>um livro terrível e penitente, que nos ajuda a compreender por que não pode a condição portuguesa ser separada do destino da humanidade. Claro que estas e outras relações não cabem num escrito desta natureza, antes pressupõem um estudo bem mais alongado. O facto de me encontrar, presentemente, a urdi-lo ditou a extensão deste artigo, levando-o para além dos limites reconhecíveis a uma simples recensão.</span> </span></p></span></strong>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-78220995897664272192007-12-29T23:33:00.000+00:002008-12-09T02:24:31.361+00:00Pensando à bolina (13)<span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="font-size:180%;"></span></strong></span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="font-size:180%;">A flor da Saudade é a Açucena</span></strong></span><span style="font-weight: bold;"><br /></span><span style="color: rgb(153, 153, 0);font-family:trebuchet ms;" ><span style="font-weight: bold;"><br />Pedro Sinde</span></span><span style="font-weight: bold;"><br /></span><br /><span style="font-size:78%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">Lilium Album. </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >The book of plants</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, Basilius Besler</span></span><br /><div style="text-align: justify;"><a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEguOBfkm2sFgJO4AI4G9D-zolA8yM9mS4f1yapbMMLKZEmylvW0IJWA7D8TQvp-C7yUH3LwHfn-5JIx8XhDg3PIosa-9aGXRgZcpFX4_DdKIFiM6LW-RrFt3bfHZPdztveTvnfXKYJ0yEQ/s1600-h/A%C3%A7ucena_edited.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5149809347167814130" style="margin: 0pt 10px 10px 0pt; float: left; width: 167px; cursor: pointer; height: 241px;" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEguOBfkm2sFgJO4AI4G9D-zolA8yM9mS4f1yapbMMLKZEmylvW0IJWA7D8TQvp-C7yUH3LwHfn-5JIx8XhDg3PIosa-9aGXRgZcpFX4_DdKIFiM6LW-RrFt3bfHZPdztveTvnfXKYJ0yEQ/s320/A%C3%A7ucena_edited.jpg" border="0" /></a><span style="font-family:trebuchet ms;">Quem assim o diz é Isidoro de Barreyra, um desses monges secretos que Sampaio Bruno tanto gostava de repescar, perdido no labirinto estreito de uma qualquer biblioteca. O livro em que o diz tem o seguinte cativante título: </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >Tratado das significaçoens das plantas, flores, e fruttus,</span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" > que se referem </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >na sagrada escrittura, tiradas de divinas, e humanas letras, com s</span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >uas </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >breves considerações</span><span style="font-family:trebuchet ms;">.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Isidoro de Barreyra, foi monge da Ordem de Cristo em Tomar, no Convento de Cristo. Este livro interessantíssimo é de 1622. Também Camilo o refere a propósito da Saudade.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Os saudosistas deviam atentar neste facto interessante que é o de haver uma flor que é o símbolo da Saudade.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Se seguirmos atentamente a explicação de Isidoro de Barreyra veremos que há ali uma cifra. Em primeiro lugar o monge começa por nos apresentar a Açucena na sua significação bíblica como símbolo de pureza. Aparece, por essa razão, ao lado da Virgem nas representações da anunciação. De seguida, muda o discurso e, ao contrário do que acontece no resto do livro, refere a significação da Açucena "entre nós", pressupõe-se que querendo dizer </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >entre os portugueses</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, mas pode ter outra significação mais funda.</span><br /><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Ora, </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >entre nós</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, a Açucena significa não a pureza, mas a Saudade. A justificação que o monge dá para isso é muito interessante, sobretudo porque não é exacta. Quer dizer, Isidoro de Barreyra explica que a Açucena tem a característica de florir mesmo quando cortada ou arrancada da raiz e colocada num recipiente com água. Ora, isto é exacto, o que não é exacto é que a Açucena seja a única flor com esta propriedade e se essa é a razão para que seja ela a simbolizar, em vez de outra, a Saudade, então há aqui um erro estranho. É por esta razão que me parece que aqui se esconde qualquer coisa de muito importante e que eventualmente estaria ligado com a Ordem de Cristo naquela altura. Um observador tão fino, como era Isidoro de Barreyra, nunca cometeria um erro tão grosseiro; o erro é uma cifra.<br /></span><span style="font-family:trebuchet ms;">Do meu ponto de vista, Isidoro de Barreyra está a cifrar algo muito importante ligado à tradição portuguesa e à Ordem de Cristo. A forma pela qual ele apresenta o assunto ali no livro, dá a entender que a Açucena representa exotericamente a pureza na iconografia Católica, mas esotericamente representa a Saudade, na tradição portuguesa. Isidoro de Barreyra diz assim: "E ainda que muitos attribuão isto à puresa da Virgem, com tudo <span style="font-style: italic;">segredo </span>tem pintaremse as Cessens [Açucenas] só neste mysterio, & não em outros."</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Tudo isto me parece ligado à noção de exílio. No próximo </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >Pensar à bolina</span><span style="font-family:trebuchet ms;"> procurarei explicar, se vi bem, qual a razão.</span> </div>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-69362090521383486022007-12-22T14:31:00.000+00:002007-12-22T14:34:39.372+00:00Vox populi, vox Dei (2)<p style="text-align: justify; font-family: trebuchet ms;" class="MsoNormal"><span style="font-size:180%;"><b><span style=";font-size:18;color:black;" >Fia-te na Virgem e não corras...</span></b></span><span style=""><br /><br /><b><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Gil da Gama</span></b><br /><br />À superfície, parece tratar-se de um adágio com fácil interpretação: <i>o melhor é fazeres o que tens a fazer e deixares-te de "crendices"</i>. Mas isso é apenas à superfície, porque se olharmos bem veremos que este adágio é o que é mas ao contrário do que é; vou-me explicar. Basta que invertamos a ordem dos factores, que, neste caso, não tem nada de arbitrário, e logo veremos de outro modo: <i>não corras, fia-te na Virgem</i>. Assim visto, estamos perante algo de uma natureza diferente, equivalente a outros adágios do mesmo tipo e que demonstram a forte confiança do povo português no sobrenatural: <i>Mais vale quem Deus ajuda, do que quem muito madruga</i> ou <i>O pouco com Deus é muito, o muito sem Deus é nada</i>. Mas como no povo português convivem duas almas em simultâneo, uma idealista e outra realista, uma que o faz acreditar no fado e outra que o faz ver que está no mundo para agir, temos de encontrar um ponto em que as duas almas, opostas só na aparência, se reúnam, aquele ponto em que o português possa voltar a dizer como disse Pessoa:<o:p></o:p></span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align: center; font-family: trebuchet ms;" align="center"><span style="font-size:100%;"><i style=""><span style="">O homem e a hora são um só<o:p></o:p></span></i></span></p> <p class="MsoNormal" style="text-align: center; font-family: trebuchet ms;" align="center"><i style=""><span style=";font-size:11;" ><span style="font-size:100%;">Quando Deus faz e a história é feita.</span><o:p></o:p></span></i></p> <p class="MsoNormal" style="text-align: justify;"><span style=";font-family:";" ><span style="font-family: trebuchet ms;">Aqui, é Deus o motor imóvel e o homem é aquele que, sendo movido, faz mover; é o construtor de pontes, restaurou a sua condição primordial de </span><i style="font-family: trebuchet ms;">pontifex</i><span style="font-family: trebuchet ms;">.</span><br /><span style="font-family: trebuchet ms;">Em qualquer um destes adágios é patente a ideia de que a acção humana desligada do divino é "nada"; não há um convite à inacção, mas apenas a ideia de que aquilo que o homem tem, pouco ou muito, se for acompanhado do divino, é "tudo". Se é verdade que </span><i style="font-family: trebuchet ms;">Deus escreve certo por linhas</i><span style="font-family: trebuchet ms;"> que ao homem parecem </span><i style="font-family: trebuchet ms;">tortas</i><span style="font-family: trebuchet ms;">, então aceitando a aparente sinuosidade com que se tece cada um dos nossos destinos, poderemos entrever a grandiosidade de um destino maior que se cumpre livremente para glória do mais alto. Assim possamos dizer: </span><i style=""><span style="font-family: trebuchet ms;">Fia-te na Virgem e corre…</span><o:p></o:p></i></span></p>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-46031033850338957942007-12-18T19:31:00.000+00:002008-12-09T02:24:31.763+00:00Escaparate (3)<span style="font-family:trebuchet ms;"><em><strong><span style="font-size:180%;color:#999900;"></span></strong></em></span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"><em><strong><span style="font-size:180%;color:#999900;">Contos da Coluna do Meio</span></strong></em>, </span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="font-size:180%;"><strong>de João Rêgo</strong><br /><br /></span></span><blockquote></blockquote><div align="justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="color:#999900;">Pedro Martins</span></strong><br /><br /></span></span><span style="font-family:trebuchet ms;">Desaparecido, de forma trágica e prematura, num acidente de aviação ocorrido em Julho deste ano, pôde, porém, felizmente João Rêgo deixar-nos um apreciável testemunho espiritual no livro intitulado <em>Contos da Coluna do Meio</em>, onde se recolhem textos publicados na imprensa local de Montemor-o-Novo, onde o escritor residiu entre 1987 e 2005.<br /><br />As linhas mestras deste pequeno volume tornam patente a influência da filosofia portuguesa – a cujo grupo pertenceu – no trajecto filos<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh64wBHrv_xmZ6IbR9vRFC1WxValuSlzjv9q7b0i7L2hCpP2hB-KHOYqZ6o9w27IgVqgm2eOFe0h2ySCvohMIJ8GJedJ7Td6UU_VJ8DuQ_FF7sKtrkapr9ZYI0jvg88bRBCjywmRhy_43JE/s1600-h/Contos+de+João+Rego.jpg"></a>ófico do autor: a sugerida crença no poder criador e movente do pensamento reflectido na palavra ou a confiança reiterada na interventora misericórdia divina são assomos autênticos de esperança e de caridade nas breves páginas destes <em>Contos da Coluna do Meio</em>, na linha do pensamento de Álvaro Ribeiro, filósofo a quem João Rêgo havia consagrado a elaboração de uma importante antologia (<em>A Medicina em Álvaro Ribeiro</em>, Edições Tomé Natanael, 1992).</span> </div><div align="justify"><br /></div><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5146400252133826050" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; WIDTH: 151px; CURSOR: hand; HEIGHT: 250px; TEXT-ALIGN: center" height="268" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjGKjutlBUfbEpO65Zers-HLlNIDPUzKNOq56lmkudFNwcFg78UzmXhpgteMbfKYEycQBO7vb9YNQx-Zx6iiPhemnW2ZjVJvMxvdLeO7B1fTdJUq5PjwEBqQ7VDiHlFLOVlyGfD74ZD8O0Y/s320/Contos+de+Jo%25C3%25A3o+Rego.jpg" width="191" border="0" /> <p align="justify"><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Com excepção do derradeiro escrito – que, aliás, confere o título à recolha –, todos os restantes são dedicados a personagens femininas, numa exaltação nobilitante da figura da mulher, que se furta aos preconceitos feministas para implicitamente os repelir. Para tanto, o autor recorre, não raras vezes, ao cânone literário universal, lançando mão de narrativas mitológicas, históricas e ficcionais, cuja exemplaridade é trazida à evidência por mor de uma exegese lúcida e inteligente. A tudo isto acresce a mestria de um comunicador dotado, que, dirigindo-se a um público heterogéneo e presumivelmente não iniciado, terá sabido, por certo, motivar nos leitores a apetência pelos grandes textos clássicos, a partir de uma pessoalíssima visão filosófica, a que a força sugestiva do título dado ao livro oferece esclarecedora coloração. </span></p>Unknownnoreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-87044492167848731962007-12-15T09:45:00.000+00:002008-12-09T02:24:31.886+00:00Vox populi, vox Dei (1)<div style="text-align: justify;"><span style=";font-family:trebuchet ms;font-size:85%;" ><span style="color: rgb(51, 51, 255);"><span style="font-weight: bold;"><span style="color: rgb(0, 0, 0);font-size:180%;" >Os adágios e a sabedoria perene</span></span></span></span><br /><br /><span style="color: rgb(204, 153, 51);"><span style=";font-family:trebuchet ms;font-size:100%;" ><span style="font-weight: bold; color: rgb(0, 0, 153);"><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Gil da Gama</span></span></span><br /></span><br /><span style="font-size:78%;">Nogueira, <span style="font-style: italic;">Árvores de Portugal</span> (Guia FAPAS)</span><br /><a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh906NAQRjQQLvzS6cwcNKJe-Q36H362JuyZlaYS03KV3bcFBhp2taXcbJpJt7yG6wFthuO9ht3sMF3o01ejeUucwFEJfZVHHaOPmHVGN_U3qNuzWPnFaOyE0a_tGCHJu0_40tOvp6tKaE/s1600-h/Nogueira.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5144274586022215954" style="margin: 0pt 10px 10px 0pt; float: left; width: 102px; cursor: pointer; height: 94px;" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh906NAQRjQQLvzS6cwcNKJe-Q36H362JuyZlaYS03KV3bcFBhp2taXcbJpJt7yG6wFthuO9ht3sMF3o01ejeUucwFEJfZVHHaOPmHVGN_U3qNuzWPnFaOyE0a_tGCHJu0_40tOvp6tKaE/s320/Nogueira.jpg" border="0" /></a><span style="font-family:trebuchet ms;">Nestes tempos do fim, o povo assume uma importância inaudita. Os sábios são cada vez em menor número e, cautelosos, são cada vez mais reservados. Na ausência dos sábios, que são o intelecto activo </span><span style="font-family:trebuchet ms;">de um povo, resta-nos a memória que guarda os seus ditos ou adágios. </span><span style="font-family:trebuchet ms;">Ao povo está reservada a nobre tarefa de ser o guardião da sabedoria.<br /></span><span style="font-family:trebuchet ms;">Os adágios não pertencem a uma época, pelo contrário, são a expressão da condição humana. Podem ser comparados aos <span style="font-style: italic;">Salmos</span>, ambos representam o homem universal. Ninguém conhece a origem dos provérbios; vindos do dia dos tempos primordiais, providencialmente guardados, como numa arca de Noé, no seio do povo, dirigem-se, pois, ao ser humano decaído, dando-lhe preciosas indicações para a sua redenção.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Nos adágios escondem-se sempre vários sentidos latentes, dos quais o povo usa, e bem, apenas o primeiro, o mais evidente.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Os desdenhosos e os invejosos usam e abusam do adágio que diz: <span style="font-style: italic;">Deus dá as nozes a quem não tem dentes</span>. A interpretação imediata deste provérbio diz-nos que a sorte parece mal distribuída, revela-nos o descontentamento daqueles que vêem a desordem do mundo, daqueles que sempre estão descontentes. Uma interpretação mais funda leva-nos, porém, para outro lado: a noz é o sinal do conhecimento, dentro da casca dura está o fruto bem protegido. É conhecida a impressionante analogia entre a noz e o cérebro, basta ler as formas, para que logo nos ocorra a bela expressão de Jacob Boehme, que dá título a um dos seus mais curiosos livros: <span style="font-style: italic;">De signatura rerum</span>, <span style="font-style: italic;">Sobre a assinatura presente nos seres</span>, em tradução livre.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">A noz, sendo a expressão do conhecimento verdadeiro, bem protegido, é entregue por Deus àqueles que não têm dentes, porque só esses não o trituram, não o desfazem, não se podem apoderar dele; dar nozes a quem tem dentes, seria como <span style="font-style: italic;">dar pérolas a porcos</span> ou, para lembrar um outro provérbio mais esquecido: <span style="font-style: italic;">comida fina em corpos grossos faz mal aos ossos</span>. O povo português exprime um saber espontaneamente aristotélico, sabendo reconhecer que cada coisa tem o seu lugar natural e, por isso mesmo, cada coisa procura o seu lugar natural. Desejar um lugar que não é o da sua natureza é a fonte da inveja e da desordem patente no mundo, pois hoje todos querem o que os outros têm e ninguém ama aquilo que tem.</span><br /><div style="text-align: center;"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span><br /></div></div>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-50976627810841730652007-12-04T18:29:00.000+00:002007-12-17T21:45:02.342+00:00A sombra de Eurídice (5)<div align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="font-size:180%;">Morte e Ressureição<br /></span></strong></span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="color: rgb(0, 0, 153);"><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Carlos Aurélio</span></span></strong></span></div><div align="left"><span style="font-family:trebuchet ms;"><strong></strong><br />Contigo, minh’alma, desci<br />Até aos confins da incompreensível dor,<br />Por abruptas feridas abertas de cor,<br />Em ti me perdi e me achei de memória.<br />Memória, essa agulha que cose, essa faca que corta<br />Coisas e loisas, vidas, lixo e chicória,<br />Esse sangue corrido, fendido,<br />Essa voz ouvida, enrouquecida,<br />Memória, esse silêncio que engendra a vida já morta.<br /><br />Fui contigo de mão dada<br />Visitar a dor, cego e seco em meu desalento,<br />Desci sem lágrimas o declive que sugava<br />Até às goelas escancaradas, ó infernal tormento!<br />Desci, desci sempre,<br />Empurrado por mim, puxado p’lo diabo,<br />Até que, farto, estanquei e disse: “Aqui acabo!<br />Já não vejo céu que me levante.<br />Onde <em>és</em>, meu Deus?...Como vou adiante?”<br /><br /><br />Chamei-te, ó pedra surda,<br />Ainda vi luz e orvalho ─ estou a lembrá-lo.<br />Ansiei por ti, ó morte, sombra da árvore bendita,<br />E também te vi cansada, desdita.<br />Falavas com o vento, ias tu consolá-lo.<br />Disse adeus e abracei-vos, ó céus,<br />Juntei as mãos e pus-me todo dentro delas,<br />Ergui-as já secas, ardendo lúgubres como velas,<br />E assim desci, consumido em mortalhas e véus.<br /><br />Gritei por ti, ó andorinha fugidia,<br />E só vi penas negras, no céu as primeiras<br />Asas que, com o meu Anjo me alembravam<br />As preces de Jesus no Horto das Oliveiras.<br />Subi, subi sempre,<br />E clamei por vós, gente irmã,<br />Olhares tardios do amor abandonado,<br />Rostos baços de vida vã,<br />Calvário sem Domingo ressuscitado.<br /><br />Até que por ti, ó Espírito, então reconheci:<br />Morri e, enquanto anoitecia, já era o sol que se erguia.<br />Ei-lo pujante, hóstia solar, a verdadeira,<br />Vi-o a levantar-me da cama derradeira.<br />Contigo minh’alma então sim, vivi,<br />E perguntei aos choupos e vendavais:<br />“Que milagre é este? Morro de pé, bem o sei!”<br />E eles assim mudos, silentes e sem ais,<br />Me disseram: “É a tua voz que te acorda,<br />a do sol,<br />a do teu Cristo e teu Rei!”<br /></span><div style="text-align: center;"><br /></div><div style="text-align: center;"><span style="font-family:trebuchet ms;"><em>1 de Dezembro de 2007</em></span></div></div><div align="center"><span style="font-family:trebuchet ms;"><br /></span></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-64185732518938749992007-12-03T11:01:00.000+00:002008-12-09T02:24:32.033+00:00Pensando à bolina (12)<div style="text-align: justify;"><span style=";font-family:trebuchet ms;font-size:85%;" ><span style="color: rgb(51, 51, 255);"><span style="font-weight: bold;"><span style="color: rgb(0, 0, 0);font-size:180%;" >As mil e uma noites de Dinarzade (I)</span></span></span></span><br /><br /><span style="color: rgb(0, 0, 0);font-family:trebuchet ms;font-size:100%;" ><span style="color: rgb(153, 153, 0); font-weight: bold;">Pedro Sinde</span><span style="color: rgb(0, 0, 153); font-weight: bold;"><br /></span></span><br /><div style="text-align: justify;"><a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjMzQg-WisonCo7trppGDgkobFFriA-npDWCSVw3Qfw2FtWN0riJniQ14Nt1SX7UNVuUZ3B1yyWGP6wDcFJTPCH6-5hp01vCCIhTPiQam_sVYZUx6ZGoqTXG7mIdPFIhKMYh8Wx-P4cQb0/s1600-h/Sheherazade.jpg"><img style="margin: 0pt 10px 10px 0pt; float: left; cursor: pointer; width: 164px; height: 164px;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjMzQg-WisonCo7trppGDgkobFFriA-npDWCSVw3Qfw2FtWN0riJniQ14Nt1SX7UNVuUZ3B1yyWGP6wDcFJTPCH6-5hp01vCCIhTPiQam_sVYZUx6ZGoqTXG7mIdPFIhKMYh8Wx-P4cQb0/s320/Sheherazade.jpg" alt="" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5140978788435659410" border="0" /></a><span style="font-family:trebuchet ms;">- Todos pensam que a heroína d'<span style="font-style: italic;">As Mil e uma Noites</span> é a bela e sábia Xerazade, mas não é; ou melhor, não é inteiramente.<br /><br /></span></div><span style="font-family:trebuchet ms;">Foi assim que Dinis me começou a falar da leitura que tem feito desta obra magnífica. Fiquei intrigado e perguntei-lhe quem era, </span><span style="font-family:trebuchet ms;">então, o herói, se seria o Sultão.<br /><br /></span><span style="font-family:trebuchet ms;">- Não, o Sultão é levado pela história; a vida de Xerazade parece estar nas suas mãos e, no entanto, ele é que está nas mãos dela. A verdadeira heroína é a irmã de Xerazade: Dinarzade.</span><span style="font-family:trebuchet ms;"> Vou procura</span><span style="font-family:trebuchet ms;">r explicar-te porque penso assim. Como sabes, o Sultão, traído pela mulher que lhe foi infiel, para não voltar a ser traído, resolve a cada dia desposar uma nova mulher, mandando-a matar no dia seguinte, depois da noite de núpcias.<br /><span style="font-size:78%;"> </span><br /></span><span style="font-family:trebuchet ms;">Xerazade, querendo libertar o reino e o próprio Sultão de tal </span><span style="font-family:trebuchet ms;">infelicidade, oferece-se ela mesma ao Sultão. Tem um plano em mente. Depois de casada e passada a noite de núpcias, mas antes de o sol nascer, começaria a contar uma história ao Sultão, mas por tal modo que a tivesse de interromper com o nascer do dia, altura em que o Sultão partiria para os seus afazeres. Teria, no entanto, de a interromper num ponto tal que o Sultão, levado pelo enredo, isto é, enredado, a poupasse esse dia para ouvir o final da história antes da manhã seguinte. Para executar este plano, necessita, no entanto, da colaboração de alguém que a acorde antes do sol nascer e lhe peça "desinteressadamente" para continuar a história. À sua irmã, Dinarzade, cabe essa missão grave de, todos os dias, a acordar antes do </span><span style="font-family:trebuchet ms;">nascer </span><span style="font-family:trebuchet ms;">do sol e, com ela, o Sultão, que partilhava o leito com Xerazade.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Dinarzade é, portanto, aquela a quem cabe estar <span style="font-style: italic;">vigilante </span>e, simultaneamente, ser o estímulo para o início de cada história. Ela é a imagem do motor imóvel, age sem agir; é ela quem acorda a irmã e o Sultão, mas quem a acorda a ela, Pedro? Ela é que é o princípio do movimento.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Percebes agora porque é que me parece que a verdadeira heroína é a Dinarzade? Ela é o espírito da irmã, que é, por sua vez, a alma do Sultão. Para que as histórias de Xerazade actuem sobre nós como actuam sobre o Sultão devemos</span><span style="font-family:trebuchet ms;"> descobrir, de algum modo, a Dinarzade em nós, esse espírito que todos os dias nos acorda para a história que temos na nossa alma e que vemos desenrolar-se no mundo <span style="font-style: italic;">fora de nós</span>. Mas as <span style="font-style: italic;">mil e uma noites</span> só começam aqui, há mais mistérios essenciais que gostava de conversar contigo. Isso terá de ficar, no entanto, para outro dia, porque agora mesmo tenho de ir embora e ver que história me conta Xerazade neste dia.</span><br /><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">E assim fiquei eu, como o Sultão</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, inquieto</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, à espera que o Dinis me fale de outros "mistérios essenciais" guardados n'<span style="font-style: italic;">As mil e uma noites</span>.</span><br /></div>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-24478511054267815942007-11-30T22:42:00.000+00:002007-12-18T21:28:42.654+00:00Sampaio Bruno<span style="font-size:78%;"><span style="COLOR: rgb(153,153,153)"><span style="color:#cc9933;"><strong>(30 de Novembro de 1857 – 11 de Novembro de 1915)</strong><br /></span></span></span><br /><em>Só um homem em Portugal mostra compreender: Sampaio Bruno. </em><br /><strong></strong><span style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(153,153,0)">Fernando Pessoa</span><strong style="FONT-WEIGHT: normal; COLOR: rgb(0,0,0)"><br /></strong>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-49985934296289850742007-11-27T23:01:00.000+00:002008-12-09T02:24:32.216+00:00No signo do 7 - 150 anos de Filosofia Portuguesa<div align="center"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEheXSZX2W75UUEM3vytpjuA76-iM7Njo-QEawtLQnik5ErKj8vET3m_PI5MRFdGHaQs4-dnye3ldao7UpoER_tEXZGRm9qJyQQ_Ugu2qwamQNM6BRuXF6RrEGtLM9epufDOHYCmrCMQ3pA8/s1600-h/Antonio+Telmo_1[1].JPG"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5137659475268773874" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEheXSZX2W75UUEM3vytpjuA76-iM7Njo-QEawtLQnik5ErKj8vET3m_PI5MRFdGHaQs4-dnye3ldao7UpoER_tEXZGRm9qJyQQ_Ugu2qwamQNM6BRuXF6RrEGtLM9epufDOHYCmrCMQ3pA8/s320/Antonio+Telmo_1%5B1%5D.JPG" border="0" /></a> <strong><span style="COLOR: rgb(0,0,153);font-size:78%;" ><span style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(153,153,0)">Sesimbra, 24 de Novembro de 2007. Pedro Sinde e António Telmo no lançamento de </span><em style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(153,153,0)">Contos Secretos</em><span style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(153,153,0)">.</span><br /></span></strong><blockquote></blockquote><div align="justify" style="font-family:trebuchet ms;"><span style="font-size:100%;">A anteceder o colóquio <em>A Filosofia Portuguesa Hoje</em>, com que se encerrou o ciclo comemorativo dos 150 anos da Filosofia Portuguesa (realizado, entre Março e Novembro, na Biblioteca Municipal de Sesimbra), teve lugar, no passado sábado, dia 24, o lançamento do livro <em>Contos Secretos</em>, de António Telmo. A obra foi apresentada por Pedro Sinde, numa sessão que contou ainda com a presença do autor, bem como do pintor Espiga, que ilustrou o volume, e de Manuela Morais, que, com a chancela da Tartaruga, o editou. A fotografia foi-nos gentilmente cedida por João Aldeia, autor do blogue <em style="COLOR: rgb(153,153,0)"><a href="http://www.sesimbra.blogspot.com/">Sesimbra</a></em><span style="COLOR: rgb(153,153,0)">.</span></span></div></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-45368703857300079842007-11-23T11:11:00.000+00:002007-12-18T21:10:16.422+00:00Bellum sine bello<strong></strong><span style="COLOR: rgb(0,0,0);font-family:trebuchet ms;font-size:100%;" ><span style="color:#999900;"></span><br /><strong><span style="font-size:180%;">Carta a Pedro Sinde</span></strong><br /></span><span style="FONT-WEIGHT: bold"></span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;font-size:100%;"></span><span style="font-family:trebuchet ms;font-size:100%;"><em></em></span><span style="font-family:trebuchet ms;font-size:100%;"><em></em></span><span style="FONT-WEIGHT: bold;color:#999900;" >António Cândido Franco</span><span style="FONT-WEIGHT: bold"><br /></span><span style="font-size:100%;"><br />Évora, 20 de Novembro de 2007</span><br /><span style="FONT-WEIGHT: bold"><br /></span>Caríssimo Pedro Sinde<br /><div style="COLOR: rgb(0,0,0);font-family:trebuchet ms;" align="justify" ><span style="font-size:100%;"><br />Peço-te antes de mais desculpa da demora desta carta, que há muito te devia em resposta a <a href="http://maranos.blogspot.com/2007/07/carta-antnio-cndido-franco-pedro-sinde.html">outra tua</a> de 7 de Julho. Encurtando razões, digo-te que a necessidade e a urgência de te responder nunca se ausentou do meu espírito e é com muito gosto que estou tentando responder às tuas perplexidades.</span></div><div style="COLOR: rgb(0,0,0);font-family:trebuchet ms;" align="justify" ><span style="font-size:100%;"><br />Começo pelo surrealismo. O surrealismo tem de ser encarado a partir da sua etimologia e a partir das suas manifestações. A etimologia das palavras não nos pode servir nuns casos e noutros não; em todos, ela ilumina o sentido da palavra, que pode estar mais ou menos obscurecido pelo tratamento humano mas nunca de todo ausente. No caso estamos de acordo que a etimologia de surrealismo nada tem a ver com a ideia do que está por baixo do real, mas antes com o que está para ou por cima. É esse inegavelmente o sentido original do surrealismo e é esse que se encontra nas suas obras mais representativas e importantes. Caso a tradução portuguesa da palavra não te agrade, podes escolher o termo sobre-realismo, que foi usado por muitos em portuguesa língua, entre eles por Agostinho da Silva.</span></div><div style="COLOR: rgb(0,0,0);font-family:trebuchet ms;" align="justify" ><span style="font-size:100%;"><br />Quanto à confusão entre ‘su’ e ‘sub’, e até em língua francesa entre o ‘sur’ e o ‘sous’, quer dizer, a confusão entre ‘surrealismo’ e ‘sub-realismo’, não a sinto como dizes. Se eu aceitasse tal confusão, teria de aceitar também que ela se estabelece, pela proximidade fonética, entre ‘sob’ e ‘sobre’. Quer dizer, não veria diferença entre palavras como ‘sobrenatural’ e ‘subnatural’. Ora não é isso que acontece no meu caso e creio que no teu também. Sei distinguir, quer no plano do sentido, quer no plano dos sons, entre ‘sob’ e ‘sobre’, como sei distinguir em língua francesa entre ‘sur’ e ‘sous’ e no caso português entre ‘surrealismo’ e ‘sub-realismo’. A distinção entre os fonemas, de quaisquer fonemas, é subtil, de pormenor, mas existe. Será que tu confundes entre trevo e treva? Entre nada e nata? Não creio. É por isso que o argumento do meu ponto de vista é forçado. Tu queres teimosamente ter razão e para isso recorres a essa confusão, fácil de fazer mas difícil de aceitar. Nestas coisas não vale ser teimoso e por isso te peço que reconheças o valor inato e original que a palavra tem, quer na portuguesa língua, quer na francesa.</span></div><div style="COLOR: rgb(0,0,0);font-family:trebuchet ms;" align="justify" ><span style="font-size:100%;"><br />Por tudo o que vai implicado no que acabo de dizer, a descida aos infernos de que falo a propósito do surrealismo deve ser encarada como uma procura dos arcanos e não como um simples entretenimento turístico à procura do abjecto, com viagem de ida e volta. Ela concorda com tudo o que dizes na tua carta sobre o assunto. Se dei a entender outra coisa, a culpa não é do surrealismo mas apenas da minha expressão insuficiente, que não conseguiu estar à altura das ideias de que falava.</span></div><div style="COLOR: rgb(0,0,0);font-family:trebuchet ms;" align="justify" ><span style="font-size:100%;"><br />Quanto às relações da Filosofia Portuguesa e do surrealismo já percebeste pelas palavras do Ruy Ventura que aquilo que dizes acerca da primeira podes dizê-lo do segundo. O surrealismo nunca pretendeu ser um movimento, mas a causa mesma do movimento, para usar as tuas palavras. Basta pensares num exemplo tão comezinho como este. Natália Correia quando pretendeu fazer uma Antologia do surrealismo português não foi a Cesariny, a António Maria Lisboa ou aos possíveis precursores destes; recuou aos primeiros momentos literários portugueses da Idade Média. O surrealismo está fora do tempo; pertence à eternidade. Estamos na verdade a falar do que está acima do real. Trata-se dum caso muito sério. O surrealismo não envelhece; é uma ideia que anima desde e para sempre a vida.</span></div><div style="COLOR: rgb(0,0,0);font-family:trebuchet ms;" align="justify" ><span style="font-size:100%;"><br />Por fim, vejamos o que chamas o ataque de Mário Cesariny à Filosofia Portuguesa. Não sei se trata dum ataque ou tão-só duma incompreensão ou até, mais simples, dum equívoco. Seja como for, também essas palavras me incomodaram quando, há muitos anos, pela primeira vez as li. No prefácio que escrevi para as poesias completas de Mário Beirão, e publicado pela Imprensa Nacional em 1996, abordo a questão de raspão. Assim como assim, o que aí digo a propósito do autor de <em>O Último Lusíada</em> pode ser alargado às relações de Cesariny com a Filosofia Portuguesa.</span></div><div style="TEXT-ALIGN: justify;font-family:trebuchet ms;" ><span style="font-size:100%;"><br />Uma coisa é certa, não me esqueço que uma ponte liga duas margens em ambos os sentidos. Tanto me incomodam as incompreensões para com o surrealismo e as suas obras como as injustiças para com a Filosofia Portuguesa e os seus autores. Recebe o abraço amigo de quem muito te estima e te escuta e lê sempre com o maior prazer e atenção<br /><br /><em>A. Cândido Franco</em></span> </div>Unknownnoreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-4600469798381608812007-11-20T08:09:00.000+00:002007-12-17T22:02:11.614+00:00Pensando à bolina (11)<div style="text-align: justify;"><span style=";font-family:trebuchet ms;font-size:85%;" ><span style="color: rgb(51, 51, 255);"><span style="font-weight: bold;"><span style="color: rgb(0, 0, 0);font-size:180%;" >A Casa Albano</span></span></span></span><br /><br /><span style="color: rgb(153, 153, 0); font-weight: bold;font-family:trebuchet ms;font-size:100%;" ><span style="color: rgb(0, 0, 153);"><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Pedro</span> <span style="color: rgb(153, 153, 0);">Sinde</span></span></span><br /><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Na terra onde vivo há, como em todas as terras, uma casa da sorte onde se vende lotaria e coisas afins, onde se vende a "sorte". O lema destas casas é o de que só sai a sorte a quem joga.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">No jogo da vida estamos todos envolvidos, queiramos ou não, joguemos ou não, porque se não jogamos a vida, é ela que joga connosco. Muitas vezes cremos que somos nós a jogá-la e é ela, no entanto, quem joga em nós.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Nunca gostei, porém, da comparação da vida com o jogo, porque sempre me pareceu entrever aí o perigo de a tomarmos por uma coisa lúdica (hoje todos parecem ter como fim último da vida a diversão!), quando o papel do homem é o de ser uma ponte entre o natural e o sobrenatural. Para dizer isto bem dito, nem devia falar em "natural", pois nada na vida o é, só os nossos olhos pobres precisam do descanso da luz sobrenatural para se refugiarem na sombra do natural; assim é que chamamos "natural" àquela parte do sobrenatural com a qual convivemos diariamente. Se víssemos a vida como sobrenatural sempre, isso implicaria uma mudança radical no sentido das nossas vidas; não estamos, todavia, interessados em mudanças destas.</span><br /><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Mas voltemos à Casa Albano; nessa casa onde se vende a taluda, o totoloto, o totobola, o euromilhões e tudo o que se possa pensar nesta gama, também se faz uma outra coisa muito curiosa. Nos seus grandes vidros afixam-se, mesmo ao lado dos números premiados, os anúncios necrológicos; de tal modo que, nas suas montras, as mesmas pessoas procuram os números para ver se lhes saiu a "sorte grande" e o nome do último "sorteado", levemente deliciadas com a certeza de que nunca verão ali o seu nome.<br /><br />Se a taluda sai a poucos, já aquela outra sorte, essa sim grande, imensa, tremenda, sai a todos. Vejo na Casa Albano, de mãos dadas, a imagem paradoxal da pródiga dama segurando o corno da abundância e a ceifeira terrível de gadanha na mão; ambas sorriem e os transeuntes não sabem se serão os próximos a ganhar o sorteio ou a ser sorteados.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Uma ligação estranhamente profunda parece haver entre ambas, como se filhas do mesmo pai, como se divisão de uma mesma energia, como se dois extremos que se tocassem; enfim, uma <span style="font-style: italic;">pescadinha de rabo na boca</span>, que é o nome que o povo português dá à hermética serpente <span style="font-style: italic;">Ouroboros</span>.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"><br />Ao passar ali todos os dias, só eu pareço, no entanto, não querer nada nem com uma nem com outra, discretamente acelerando o passo no outro lado da rua.<br /></span><div style="text-align: center;"><br /></div></div>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-21853049188763433562007-11-12T08:54:00.000+00:002007-12-18T21:12:48.756+00:00Pensando à bolina (10)<div style="TEXT-ALIGN: justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="COLOR: rgb(51,51,255)"><span style="FONT-WEIGHT: bold"><span style="COLOR: rgb(0,0,0)">Da não existência da filosofia portuguesa</span></span></span><br /><br /><span style="FONT-WEIGHT: bold"><span style="COLOR: rgb(0,0,153)"><span style="COLOR: rgb(153,153,0)">Pedro</span> <span style="COLOR: rgb(153,153,0)">Sinde</span></span></span><br /><br /></span><span style="font-family:trebuchet ms;">Não há filosofia portuguesa. É um dado evidente. É quase um facto. Basta olhar para os autores da filosofia portuguesa para ver que ela não existe. Vejamos.<br /></span></div><p class="MsoNormal" style="TEXT-ALIGN: justify"><span style="font-family:trebuchet ms;">Sampaio Bruno é um gnóstico que trata as ideias platónicas como Aristóteles estudaria uma planta (não nos fala ele na eclosão da ideia na alma do génio?); e, como se não bastasse, acredita que a humanidade inteira será um dia o messias, o D. Sebastião esperado.<br />Leonardo Coimbra rejeita todos os sistemas de filosofia como formas de "cousismo", isto é, como momentos de paragem do movimento e propõe uma filosofia que é a sua própria negação: uma filosofia do movimento, em que cada nova forma supera a anterior. Deste modo recusa implicitamente a existência de sistemas, a não ser como momentos provisórios.<br />Álvaro Ribeiro propõe uma filosofia que é uma teologia, um caminho para Deus, um caminho de santidade; os que só vêem à superfície chamam-lhe, para o denegrir, neo-aristotélico, não vêem que isso é apenas a capa sob a qual se esconde um pensamento tremendamente revolucionário.<br />José Marinho é um místico de uma lucidez extrema, mas de uma lucidez que tem pudor em mostrar-se como tal e, por isso, nunca edificaria um sistema.<br />Agostinho da Silva, enfim, foi o que foi, ninguém sabe o que foi e, por isso, chamam-lhe comunista, monárquico, anarquista ou franciscano, budista, taoísta. Tudo isso cabia na sua alma imensa, mas ele mesmo não era nada disso; acreditava no quinto império e entendia que os portugueses tinham por missão mostrá-lo ao mundo.<?xml:namespace prefix = o /><o:p></o:p></span></p><div style="TEXT-ALIGN: justify"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></div><p class="MsoNormal" style="TEXT-ALIGN: justify"><span style="font-family:trebuchet ms;">É por isso que há dois tipos de inimigos da filosofia portuguesa: alguns dos que dizem que ela existe e todos os que dizem que ela não existe. Os primeiros tentam encontrar um sistema e teses que dêem unidade à diversidade magnífica, como se dissessem que todas as plantas têm tronco; os segundos comparam-na com o pensamento sistemático alemão ou francês e não encontram nenhum sistema de filosofia português; e têm razão, porque eles chamam filosofia precisamente ao que vêem na Alemanha, na França, em Itália e, agora muito em voga, nos Estados Unidos.<br />A verdade é que a filosofia portuguesa não tem nada a ver com isso e é desta perspectiva que podemos dizer que ela não existe, pois, graças a Deus, não há um sistema de filosofia portuguesa.<br /><br />Agora vou dizer, só na aparência, o contrário do que disse: há filosofia portuguesa, é evidentíssimo que há, mas ela não pode ser pensada a partir dos moldes habituais. A nossa filosofia é aquela que, como diz quem chamou a atenção para ela </span><span style="font-family:trebuchet ms;">– Álvaro Ribeiro –</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, está escondida na nossa literatura, na nossa arte, na nossa arquitectura, na nossa paisagem, no nosso mar, na nossa sabedoria popular e até nos nossos filósofos. Poderia ter-lhe chamado pensamento português ou tradição portuguesa, mas com isso não teria concitado a atenção à volta do tema; teria sido uma intervenção mais ou menos inócua. Ao chamar-lhe filosofia portuguesa conseguiu irritar a academia e isso foi bom para que as águas se agitassem.<br /><br />A filosofia portuguesa é uma floresta muito variada, todos os seus autores têm a lucidez de saber que não podem edificar um sistema. A filosofia portuguesa é a mesma dos nossos descobridores: partem nas caravelas do pensamento e vão vendo o que lhes aparece nessa aventura; estão em movimento e só desse modo vão descobrindo os brasis, as índias e parece que até as austrálias da alma; num momento aproximam-se daqui e noutro dali, mas sabem que não são nem daqui nem dali. Não é à toa que os portugueses saíram de Portugal assim que o conquistaram. O português é um viajante, um peregrino e, por isso, quando pensa o mundo, isto é, quando filosofa, é como se navegasse.</span></p><p class="MsoNormal" style="TEXT-ALIGN: justify"><span style="font-family:trebuchet ms;">Assusta-me ver a filosofia portuguesa nas universidades. Tenho a esperança de que, apesar disso, nunca cheguem a inventar um sistema de filosofia portuguesa, porque enquanto não houver sistema haverá perguntas, quando houver sistema haverá respostas. Prefiro a beleza do perguntar à estultice do responder, quer dizer, do julgar que se sabe ao ponto de ter respostas; porque, como os nossos nobres navegadores, estamos a procurar e, assim que descobrimos o que procurávamos, logo partimos para outro lugar. É preferível a cegueira de achar que não existe filosofia portuguesa, ao acreditar que ela existe e querer enfiá-la num corpete, retirar-lhe aquilo que fundamentalmente a caracteriza: o amor da liberdade de pensar e até de se contradizer, se for caso disso.</span></p>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-59852243379221669852007-11-03T10:16:00.000+00:002008-12-09T02:24:32.483+00:00Pensando à bolina (9)<div style="TEXT-ALIGN: justify"><span style="font-size:85%;"><span style="COLOR: rgb(51,51,255);font-family:trebuchet ms;" ><span style="FONT-WEIGHT: bold"><span style="COLOR: rgb(0,0,0);font-size:180%;" >A montanha inatingível<span style="font-size:100%;"><br /></span></span></span></span></span><span style="font-size:100%;"><span style="FONT-WEIGHT: bold; COLOR: rgb(0,0,153)"><br /><span style="COLOR: rgb(153,153,0);font-family:trebuchet ms;" >Pedro Sinde</span></span><br /></span><span style="font-size:100%;"><br /><span style="font-family:trebuchet ms;font-size:78%;">Carlos Aurélio: Estrela, o manto do céu. <span style="FONT-STYLE: italic">Hesed</span></span><br /></span><div style="TEXT-ALIGN: justify"><a onblur="try {parent.deselectBloggerImageGracefully();} catch(e) {}" href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjVDyRi4xIKu7lmlkqa2kkAInaVtOF2i1EQ5OZf8LYmkg6XDyMUndClFxsgTKVakrfjgXj7rjXy8_IZqZo3KraHa5Kmo_9s2yTP7Bu9KL7-NdWVciBDIJMnZCOdwrxcAgpdHMnbUlzReEY/s1600-h/Carlos+Aurélio+Serra+da+Estrela.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5140973342417128066" style="FLOAT: left; MARGIN: 0pt 10px 10px 0pt; WIDTH: 205px; CURSOR: pointer; HEIGHT: 106px" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjVDyRi4xIKu7lmlkqa2kkAInaVtOF2i1EQ5OZf8LYmkg6XDyMUndClFxsgTKVakrfjgXj7rjXy8_IZqZo3KraHa5Kmo_9s2yTP7Bu9KL7-NdWVciBDIJMnZCOdwrxcAgpdHMnbUlzReEY/s320/Carlos+Aur%C3%A9lio+Serra+da+Estrela.jpg" border="0" /></a><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="font-size:100%;">Caminhei por vales e montes, mas não cheguei à montanha. Não quiseste que subisse até ti, que olhasse o panorama distante, longe dos homens, que se avista do teu cimo. Não quero saber por que enviaste aquele dilúvio; agradeço-te até por não ter chegado. O que é </span><span style="FONT-STYLE: italic;font-size:100%;" >chegar</span><span style="font-size:100%;">, </span><span style="font-size:100%;">afinal, senão a ilusão de julgar que se chegou?, a tristeza de se ter chegado?</span><br /></span></div><div style="TEXT-ALIGN: left"><span style="font-family:trebuchet ms;"><br /></span></div><span style="font-family:trebuchet ms;font-size:100%;">O peregrino que chega à sua Jerusalém, chora quando chega, chora <span style="FONT-STYLE: italic">porque </span>chega, chora porque quer já partir novamente, chora, enfim, porque no íntimo de si sabe que não chegou, sabe que nunca poderá chegar; e de estação em estação, de Jerusalém em Jerusalém, continuará a caminhar. Ele parece amar o destino para que se encaminha, mas não é assim, ama mais ainda o caminho, porque o destino é o mesmo para tantos outros, mas o caminho é só dele.<br /><br /></span><span style="font-family:trebuchet ms;font-size:100%;">Tu, montanha alta, serás a minha Ítaca. Serás a mais alta das montanhas, a inatingível. Em cada lugar por onde passe, será sempre o teu cerro que procurarei. Pobres dos que crêem que, por terem subido, chegaram a ti. Não sabem que ninguém pode subir a montanha, que a montanha não se sobe; na ilusão da subida nem reparamos que é ela quem bondosamente desce até nós.<br /><br /></span><span style="font-family:trebuchet ms;font-size:100%;">O homem, peregrino, caminhante, aspira a qualquer coisa que nunca chega a encontrar plenamente. O que procura não é deste mundo. Uma ânsia, a que em português se chama <span style="FONT-STYLE: italic">saudade</span>, vibra como uma chama no mais íntimo da sua alma; é essa chama o seu guia.<br /></span><div style="TEXT-ALIGN: justify"><span style="font-size:100%;"><br /></span></div></div>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-20870171955123116682007-10-26T20:48:00.000+01:002007-12-17T22:07:38.391+00:00Pretextos (5)<div align="justify" style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="font-size:180%;">Rafael Monteiro e a filosofia portuguesa </span><span style="font-size:130%;">(3)*<br /></span></strong><br /><strong style="color: rgb(153, 153, 0);"><span style="color: rgb(0, 0, 153);"><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Pedro</span> <span style="color: rgb(153, 153, 0);">Martins</span></span></strong></div><strong style="font-family:trebuchet ms;"><span style="color: rgb(0, 0, 153);"></span></strong><div style="font-family: trebuchet ms;" align="center"><a style="color: rgb(153, 102, 51);" href="http://maranos.blogspot.com/2007/10/pretextos-3.html"><strong>(ler aqui a 2.ª parte)</strong><br /></a></div><blockquote style="font-family: trebuchet ms; color: rgb(153, 102, 51);"></blockquote><div style="font-family: trebuchet ms;" align="justify"><br />Rafael Monteiro foi, antes de mais, um historiador. Talvez por isso, a sua obra filosófica percorre sobretudo, e quase sempre, os caminhos da <em>filosofia da história</em>. O pensador procura encontrar um sentido que englobe o movimento dos homens e dos povos no tempo e no espaço. No fundo, a própria história é uma viagem, e, como tal, tem um ponto de partida e um ponto de chegada.<br /><br />O ponto de partida dessa viagem parece ser a queda narrada na alegoria do <em>Génesis</em>, em consequência do <em>pecado original</em>. Rafael Monteiro considera que, nesse preciso momento, termina sobre a Terra a Idade do Ouro. O movimento que então se inicia implica um gradual afastamento do princípio; e deve, por isso, ser considerado numa perspectiva cíclica, que é revelada simbolicamente pela imagem do círculo.<br /><br />Isto significa que Rafael Monteiro não acredita num desenvolvimento histórico linear e, consequentemente, recusa a ideia de um progresso continuado da Humanidade. Continuada, só a decadência, a degradação, a descida degrau a degrau, porque a queda ainda não terminou. Esta visão pessimista da história, que está bem patente na sua obra historiográfica, conjuga-se notavelmente com a ideia de <em>V Império</em>, a que Rafael dedicou, aliás, um artigo publicado na revista <em>Tempo Presente</em>.<br /><br />Quem ainda se recordar daquilo que o Pedro Sinde disse há um ano nesta sala, no colóquio sobre Agostinho da Silva, saberá que, de acordo com a Tradição, à Idade do Ouro se sucedem a da Prata, a do Bronze e a do Ferro, e que a estas quatro idades correspondem os quatro impérios sonhados por Nabucodonosor. Há depois um quinto império, que é, no sonho do rei da Babilónia, a pedra que se desprende da montanha sem intervenção de mão humana, e que irá pôr termo à história, isto é, aos impérios anteriores.<br /><br />O quinto império, instituído por intervenção divina, opera a redenção da Humanidade e corresponde ao ponto de chegada do movimento histórico. Por aqui se vê que a filosofia da história de Rafael Monteiro é um <em>messianismo profético e providencialista</em>. Rafael acredita que o erro e o mal hão-de ser eliminados pela intervenção divina. Mas, para que a graça plenamente se manifeste e o reino de Deus se cumpra enfim na república dos homens, é necessário que estes exercitem as três virtudes teologais: a Fé, a Esperança e a Caridade. A esta luz se compreende a Idade do Espírito Santo, sucedendo à Idade do Pai e à Idade do Filho, anunciando e preparando o V Império, a Parúsia ou a segunda vinda de Cristo. Rafael aborda este tema admiravelmente em <em>O Culto do Espírito Santo</em>, um dos dois artigos que publicou no jornal <em>57</em>.<br /><br />O seu pensamento volta a estar, assim, muito próximo das ideias de Sampaio Bruno e Teixeira de Pascoaes. Mas parece ser sobretudo na obra de Álvaro Ribeiro (e, em especial, nas páginas de <em>A Razão Animada</em>) que Rafael colhe os ensinamentos mais importantes.<br /><br />Nada disto põe em causa a <em>originalidade</em> da sua obra filosófica. Essa originalidade reside principalmente nos caminhos que por ele são trilhados, ou seja, nos argumentos inovadores com que sustenta teses já anteriormente enunciadas por outros. Valerá para o pensamento fecundo de Rafael a citação de Goethe que ele emprega no escrito notável sobre a procissão das Chagas: <em><strong>“Não se anda só para chegar, mas para viver o caminho”</strong></em>. </div><blockquote style="font-family: trebuchet ms;"></blockquote><div style="font-family: trebuchet ms;" align="justify">É, por exemplo, o que sucede no primeiro artigo publicado no jornal <em>57</em>, em Setembro de 1958, e intitulado <em>Relações esquecidas do mito português</em>, em que, conjugando subtilmente a leitura do <em>Dom Quixote</em> de Cervantes com o nosso <em>Amadis de Gaula</em>, consegue demonstrar a singularidade do destino histórico de Portugal no contexto medieval europeu. A sua ideia parece ser esta: a Idade Média termina muito mais cedo em Portugal do que no resto do velho continente. Com a vitória em Aljubarrota, viramos as costas à Europa, com quem nos não identificamos, e iniciamos a aventura marítima.<br /><br />Há aqui um aspecto curioso, e muito significativo, para o qual gostaria de chamar a vossa atenção. É que nesse mesmo mês (Setembro de 1958), mas num outro artigo, publicado no <em>Diário de Notícias</em>, Rafael, partindo, com argúcia, das conclusões do insuspeito Lúcio de Azevedo, refuta brilhantemente a ideia de que os Descobrimentos portugueses, que são uma etapa necessária, e já cumprida, do nosso destino messiânico, possam ser cabalmente explicados por motivos de ordem material, económica e comercial.<br /><br />O facto de Rafael ter publicado, quase em simultâneo, dois escritos da maior originalidade e que tão bem se articulam entre si, é susceptível de nos revelar a vastidão e a profundidade do seu pensamento e leva-me a supor que, noutras circunstâncias, ele poderia ter sido um dos grandes filósofos portugueses do século XX. É, aliás, o que pressinto de cada vez que leio o que ele escreveu sobre os painéis atribuídos a Nuno Gonçalves, onde a autenticidade das suas ideias se estende às conclusões que tem a feliz ousadia de nos apresentar. Mas, sobre isso, vai agora falar-nos o Luís Paixão.<br /><br /><em>Cotovia, 16 de Setembro de 2007</em></div><div style="font-family: trebuchet ms;" align="justify"><em></em></div><div style="font-family: trebuchet ms;" align="justify"><em></em></div><div align="justify"><span style="font-size:78%;"><strong><span style="color: rgb(153, 153, 153);"><em style="font-family:trebuchet ms;"><blockquote><span style="font-size:78%;"><strong><span style="color: rgb(153, 153, 153);"><em></em></span></strong></span></blockquote>* </em><span style="font-family:trebuchet ms;">Comunicação apresentada ao colóquio </span><em style="font-family: trebuchet ms;">Rafael Monteiro, Sesimbra e a Filosofia Portuguesa</em><span style="font-family:trebuchet ms;">, realizado na Biblioteca Municpal de Sesimbra, em 22 de Setembro de 2007.</span> </span></strong></span></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-50204261009194608282007-10-12T22:15:00.000+01:002007-12-17T22:08:51.244+00:00Pensando à bolina (8)<div style="text-align: justify;"><span style="font-size:180%;"><span style="font-weight: bold;font-family:trebuchet ms;" >Amor fati</span></span><br /><span style="font-size:100%;"><br /><span style="font-family:trebuchet ms;"><span style="font-weight: bold; color: rgb(0, 0, 153);"><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Pedro</span> <span style="color: rgb(153, 153, 0);">Sinde</span></span><br /><br /></span><span style="font-family:trebuchet ms;">"Amor fati" é uma expressão latina que exprime a ideia de que se deve amar o seu próprio destino. De vez em quando somos confrontados com acontecimentos inevitáveis, mesmo que nos pareçam pequenos. Perante o inevitável, o necessário, o destino, podemos resignar-nos ou, então, numa atitude de alma mais nobre, aceitá-lo como se tivesse sido uma escolha nossa.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Somos muito menos do que a imagem superficial ridícula que fazemos de nós, mas também somos muito mais, isto é, existe em nós uma sabedoria latente, profunda, pré-natal, que ultrapassa tudo quanto podemos sonhar. Infelizmente estamos separados de nós mesmos, vivemos à superfície de nós mesmos.</span><br /><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">No mito de Er, Platão descreve que a alma, antes de nascer, escolhe o seu destino. Perante isto, sabendo isto, podemos, pois, aprender a descobrir porque é que escolhemos aquele acontecimento da nossa vida. Aprendendo a amar o nosso destino, aproximamo-nos daquela parte de nós que sabe, daquela parte da qual estamos separados. Em religião chama-se a essa parte de nós, o anjo; em filosofia aristotélica, a enteléquia ou o intelecto activo; ela é o céu do nosso pensamento, nós somos a sua terra, a terra onde se realiza a sua acção.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">O português é, dos povos europeus, aquele que melhor conhece a noção de "fado", mas deleita-se excessivamente nele, sem procurar compreendê-lo, quando aquilo que importava era precisamente que sublimasse esse sentimento no cadinho da emoção.</span><br /><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Este é, talvez, um dos mais difíceis caminhos, é, também, um dos mais belos.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">Se amarmos o que nos acontece de tal modo que saibamos que foi desejado por nós, iremos percebendo também a razão de ser do nosso destino, mesmo, sobretudo, no meio do sofrimento.</span><br /><span style="font-family:trebuchet ms;">De todos os acontecimentos, o mais terrivelmente fatal é a morte, a dos nossos queridos e a nossa. Mesmo a morte, a nossa morte, há-de ter sido desejada.</span><br /></span><div style="text-align: justify;"> </div><br /></div>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-72629128677913610102007-10-05T08:41:00.000+01:002007-12-17T22:10:12.502+00:00Pretextos (4)<div align="justify" style="font-family:trebuchet ms;"><strong><span style="font-size:180%;">Rafael Monteiro e a filosofia portuguesa <span style="font-size:78%;">(2)*</span><br /></span></strong><br /><span style="color: rgb(0, 0, 153);"><strong><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Pedro</span> <span style="color: rgb(153, 153, 0);">Martins</span></strong></span><strong></strong></div><div align="center" style="font-family:trebuchet ms;"><span style="color: rgb(102, 102, 102);font-size:85%;" ><strong><a href="http://maranos.blogspot.com/2007/09/pretextos-4.html">(ler aqui a 1.ª parte)</a> <blockquote></blockquote><blockquote></blockquote></strong></span></div><div style="font-family: trebuchet ms;" align="center"></div><div style="font-family: trebuchet ms;" align="center"></div><div face="trebuchet ms" align="justify"></div><div style="font-family: trebuchet ms;" align="justify">É sabido que Rafael Monteiro foi um destacado elemento da Mocidade Portuguesa local. Por isso, ao chegar à idade adulta, no início da década de 40, estava naturalmente identificado com o Estado Novo, que lhe propunha uma determinada ideia de Deus, da Pátria e da Família. Não deixará de colher dissabores junto de figuras mais ou menos importantes do regime, mas isso são contas de outro rosário.<br /><br />Um dia, porém, passados os momentos dramáticos do ciclone de 15 de Fevereiro de 1941, e atenuados os seus efeitos devastadores, algo muda. É chegada a altura de lhe darmos a palavra: <em><strong>“Vindo da terra das bruxas (Arruda) um dia chegou o António Telmo; e entrou na roda, foi o «eixo» da roda. Com ele aprendemos a ler os “Lusíadas”, a conhecer Sampaio Bruno e Leonardo Coimbra, a amar Teixeira de Pascoaes”</strong></em>.<br /><br />Com apenas 16 anos, mas agraciado já com a leitura de um livro que decidiu toda a sua vida espiritual – <em>Literatura e Ocultismo</em>, de Denis Saurat –, António Telmo veio rasgar horizontes e abrir panoramas a quem, até então, estivera, de alguma forma, encerrado na <em>cova funda</em>, confinado às ruas estreitas do velho burgo piscatório.<br /><br />A descoberta de Sampaio Bruno, Leonardo Coimbra e Teixeira de Pascoaes, que António Telmo lhe proporcionou, terá deixado marcas profundas a Rafael Monteiro. Aqueles autores não recusam propriamente a fórmula <em>Deus, Pátria e Família</em>, proclamada por Salazar; mas estão nos antípodas do ditador, e dão, por isso, um sentido bem diferente às três ideias basilares, que tão próximas se encontram das três disciplinas filosóficas fundamentais.<br /><br />Será difícil dizer até que ponto o <em>veneno</em> da tradição portuguesa, que em boa hora lhe foi inoculado pelo António Telmo, irá mudar a sua vida. Qualquer conjectura que eu arriscasse acabaria por ser ridícula, quando ainda há pessoas que, sobre isso, nos podem dar o seu testemunho fidedigno. Se a imagem me é permitida, limitar-me-ei a afirmar que a semente lançada à terra encontrou um terreno fértil.<br /><br />Há depois um segundo marco.<br /><br />Com 36 anos, exactamente no meio do caminho da sua vida, na idade em que Sampaio Bruno, Álvaro Ribeiro ou António Telmo conceberam ou publicaram livros inaugurais e decisivos, Rafael Monteiro escreveu um espantoso <em>Depoimento</em> – é esse o título que lhe dá –, que se manteve inédito até 2001, ano em que foi recolhido no volume <em>Alguns Mareantes Desconhecidos de Sesimbra e outros textos</em>. De alguma forma, tudo ali é questionado, interrogado, interpelado. A começar pela famigerada trilogia, que Salazar não quis discutir e que, com esse seu gesto de recusa, pode ter tornado irrecuperável.<br /><br />Tenho para mim que este é o seu escrito mais importante. É também aquele que mais facilmente nos permite filiar Rafael na filosofia portuguesa. Pela sua leitura, podemos verificar até que ponto este homem religioso, que incessantemente procurava Deus, se distancia, logo na sua infância, da Igreja Católica, para depois a criticar em certos aspectos da doutrina, ou denunciar as contradições existentes entre essa doutrina e a prática quotidiana.<br /><br />Assim, Rafael Monteiro confessa-nos que <em><strong>“na catequese, com um lapitos, riscava a palavra “Romana” na frase do catecismo: “Católica, Apostólica, Romana”</strong></em>, pois entendia, no seu <em><strong>“senso ingénuo que deveria lá estar “Portuguesa”, pois em Portugal” “nascera e não em Roma”</strong></em>. Neste ponto, Rafael não poderia estar mais próximo de Sampaio Bruno e Teixeira de Pascoaes, defensores da criação de uma Igreja nacional, portuguesa, lusitana.<br /><br />Também a <em>confissão</em> e o <em>celibato</em> dos sacerdotes lhe causavam perplexidade ou confusão. Na sua óptica, a confissão, levando o sacerdote a absolver o fiel dos pecados cometidos, torna-o <em><strong>“um ente maior e melhor do que Deus”</strong></em>, e conduz necessariamente à sua deificação. O celibato dos sacerdotes percebe-se mal, torna-se mesmo incompreensível, quando a Igreja diz defender a Família e a tradição nos ensina que a Maternidade é superior à Virgindade, pois Nossa Senhora foi Esposa e Mãe.<br /><br />É curioso observar que, de um certo ponto de vista, Rafael volta a estar muito próximo de Sampaio Bruno. Para este filósofo, a confissão auricular era o veículo de uma escravatura moral, que vinculava a mulher ao sacerdote; e só a eliminação do celibato imposto aos clérigos faria com que a mulher abandonasse espontaneamente o confessionário, pois esta, por uma questão de pudor e de orgulho, deixaria de confiar ao padre assuntos que ele, presumivelmente, iria comunicar à sua própria esposa.<br /><br />De outro ponto de vista, a valorização que Rafael Monteiro faz do sacramento do Matrimónio, em detrimento do da Ordenação, identifica-o com Álvaro Ribeiro. É, aliás, nesta linha de pensamento que se insere outra crítica sua apontada à Igreja, motivada pela estranheza que lhe causa o facto de só serem <strong><em>“brancos os caixões das crianças e das pessoas solteiras, e negros os outros, como se o casamento, que a Igreja consagra, fosse pecado, acto impuro – contrário de bondade e de amor”</em></strong>.<br /><br />Aliás, Rafael Monteiro diz não se entristecer perante a morte, pois, como cristão, vê nela uma forma de redenção. Neste aspecto, Rafael volta a seguir de muito perto a doutrina de Álvaro Ribeiro, e só não compreende que a Igreja <em><strong>“revista todos os actos fúnebres de panejamentos negros e chore o finado”</strong></em>. No seu entendimento infantil, <strong><em>“a Igreja deveria alegrar-se com a morte, se realmente crê, como propaga, ser a morte redenção”</em></strong>.<br /><br />Perante tudo isto, bem se entende que Rafael Monteiro nos afirme não haver encontrado resposta para as suas interrogações no templo e nos sacerdotes, ao sentir vedado, ou interrompido, o caminho que, na sua infância, o unia a Deus.<br /><br />Rafael vai, então, procurar essa resposta na filosofia, e de Platão e Aristóteles a Dante e a Hegel, lê quase tudo quanto de verdadeiramente importante há para ler. Agora, busca Deus livremente, e admite mesmo chegar a entrevê-lo aqui e ali, mas sentindo-o sempre longe, inacessível e estranho ao seu sentir de português.<br /><br />Só a filosofia portuguesa lhe dará a resposta que procurava, só ela lhe mostrará o caminho de regresso a Deus. A leitura contínua e meditada da obra de Álvaro Ribeiro vem a revelar-se fundamental. E Rafael confessa, por fim, ter chorado ao ler o prefácio de <em>A Razão Animada</em>, livro a que simplesmente chama <em>o Evangelho, a Boa-Nova da Pátria</em>.<br /><br />A leitura da obra-prima de Álvaro parece ter tido o fulgor das revelações. Foi decisiva e definitiva. À parte os escritos sobre os painéis ditos de Nuno Gonçalves, que são mais tardios, a sua obra filosófica virá a lume quase imediatamente, nos três anos seguintes, entre 1958 e 1960, em boa parte nas páginas do jornal <em>57</em>. Vamos agora falar um pouco sobre ela.<br /><br /><strong><span style="color: rgb(102, 102, 102);font-size:85%;" >(continua)</span></strong></div><div style="font-family: trebuchet ms;" align="justify"><span style="color: rgb(153, 153, 153);font-size:78%;" ><strong>* Comunicação apresentada ao colóquio <em>Rafael Monteiro, Sesimbra e a Filosofia Portuguesa</em>, realizado na Biblioteca Municipal de Sesimbra, em 22 de Setembro de 2007.</strong></span></div>Unknownnoreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-3748192221676443752007-10-04T19:23:00.000+01:002007-12-17T23:46:53.052+00:00Pensando à bolina (7)<div style="text-align: justify;"><span style="font-size:180%;"><span style="font-weight: bold;font-family:trebuchet ms;" >Os esotéricos</span></span><br /><span style="font-size:100%;"><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-weight: bold; color: rgb(0, 0, 153);"><span style="color: rgb(153, 153, 0); font-family: trebuchet ms;">Pedro </span><span style="color: rgb(153, 153, 0);font-family:trebuchet ms;" >Sinde</span></span><br /><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">Chama-se </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >mentira </span><span style="font-family:trebuchet ms;">ao acto de falar sobre aquilo que não sabemos. Visto desta perspectiva, o homem é naturalmente mentiroso e pouco mais é do que isso, porque, no fundo, nada sabe do mundo em que vive e passa todo o tempo numa tagarelice fantasista .</span></span><span style="font-size:100%;"><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">A mentira atinge a sua mais irónica perversão entre as pessoas ditas "espirituais", que </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >gostam </span><span style="font-family:trebuchet ms;">de "esoterismo". Falam de "corpos astrais", de "mundos paralelos", "reencarnação", "chakras" e organizam a sua vida em torno disso. Não deram ainda o primeiro passo na nobre doutrina da autognose e falam como se soubessem tudo, tudo explicando por um ou dois termos da moda: </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >energia e vibração</span><span style="font-family:trebuchet ms;">. Um e outro são utilizados num leque de acepções tão vasto que neles cabe qualquer coisa; e como neles cabe qualquer coisa, servem para explicar tudo.</span><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">Passam horas a </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >meditar</span><span style="font-family:trebuchet ms;">; mas que coisa é meditar? São incapazes do mínimo gesto de bondade, de olhar atentamente o outro e ver o que ele necessita; vivem fechados no seu umbigo, a que chamam, deleitados, o </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >chakra do plexo solar</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, se não lhe derem um outro qualquer nome hindú ou chinês difícil de pronunciar.</span><br /><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">Agora mesmo o sol, pondo-se, chegou ao horizonte depois de ter estado escondido por uma longa faixa de nuvens. A luz laranja cantou subitamente o seu hino fulgurante, ígneo; quase é possível ouvi-la. Magnífico!</span><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">Deixemos, pois, esses astrais, quando temos aqui mesmo o </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >astro</span><span style="font-family:trebuchet ms;">. Deixemos as literatices e olhemos para o mundo magnífico em que estamos. Em vez de uma </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >meditação</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, façamos uma oração e que ela não seja um pedido, mas apenas um agradecimento. Já temos tudo connosco, não precisamos de mais; pelo contrário, precisamos é de menos, porque o que temos a mais não nos deixa ver.</span><br /></span></div><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;"></span></span><div style="text-align: center;"><br /></div>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1212425125704797832.post-55124943671192053842007-09-30T09:39:00.000+01:002007-12-17T23:39:46.578+00:00Pensando à bolina (6)<div style="text-align: justify;"><span style="font-size:180%;"><span style="font-weight: bold;font-family:trebuchet ms;" >Brevíssimo diálogo desconcertante</span></span><br /><br /><span style="font-weight: bold; color: rgb(0, 0, 153);font-family:trebuchet ms;" ><span style="color: rgb(153, 153, 0);">Pedro Sinde</span></span><br /><br /><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">Encontro um amigo na rua e saúdo-o naquele estado habitual em que se saúdam as pessoas umas às outras, quer dizer, em que é o hábito social a falar por nós, em que perguntamos sem que esperemos uma resposta verdadeira.</span><br /><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">- Como estás? Correu-te bem o dia?</span><br /><br /></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">Olhou-me com ar pensativo. Estranhei a demora na resposta; </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >não é normal</span><span style="font-family:trebuchet ms;">, perante uma banal pergunta de cortesia, o nosso interlocutor ficar mesmo a pensar nela. Ele </span><span style="font-style: italic;font-family:trebuchet ms;" >levou a sério</span><span style="font-family:trebuchet ms;"> a pergunta. Ao fim de algum tempo, que mais parecia não ter fim, respondeu, fitando-me profundamente:<br /><br /></span></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">- Sinde, meu caro, passou mais um dia, foi milagre atrás de milagre e, no entanto, eu vivi-o como se fosse natural estar vivo...<br /><br /></span></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">- Como assim? - perguntei, ainda absorto no meio da estupefacção.<br /><br /></span></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">- Repara, o sol ergueu-se no céu e veio iluminar a terra; eu despertei como que da morte, pois deitei-me de noite e só me levantei com o sol a erguer-se e não me lembro de nada entre o deitar e o levantar; andei, senti, pensei, pude olhar o mundo e tudo isto sem sentir que estou vivo. Não é espantosa a estupidez a que se pode chegar?<br /><br /></span></span><span style="font-size:100%;"><span style="font-family:trebuchet ms;">- Pois - balbuciei, turbado e desconcertado. - Até amanhã, Dinis! - preferi despedir-me, antes que eu mesmo começasse a <span style="font-style: italic;">sentir </span>que estou vivo.<br /></span></span><div style="text-align: center;"><br /></div></div>Sindehttp://www.blogger.com/profile/18288174792017169342noreply@blogger.com1