domingo, 13 de janeiro de 2008

AFORISMOS SOBRE PORTUGAL (2)

Eduardo Aroso

8. A indiferença jamais tocará a costa de qualquer ponto cardeal; nunca apertará a mão ao nosso semelhante, para lavrar futuras rotas do mapa-mundo. A indiferença jamais saberá que a Terra é redonda.

9. Há fragas no litoral que lembram quilhas de embarcações estáticas. Mas basta que a flor do sonho nasça, no silêncio prenhe de toda a intuição que há na pureza do orvalho nocturno, para haver fome do céu. E nesta ânsia, no que nos cabe de indeterminismo do nosso sagrado instinto civilizacional, a procura é o feixe quântico de todos os rumos do espírito.

10. Nós pelos outros; nunca nós por apenas nós. Está é a divisa pela qual poderíamos definir a ideia mais ampla de portugalidade. O que assim não for poderá dar lugar a alguma forma de desintegração, a uma cinzenta formatação de ideias de pseudo internacionalismos, ou até fortalecer alguma subtil forma de absorção pelos nossos vizinhos. Se a verdade a vemos como ilusão, na indecisão entre a face externa e o lado de dentro, poderemos admitir ou não, qualquer dia, um outro 1640.
Mas não deverá ser necessário outro Tratado de Tordesilhas, porque, para ir às «Índias do Espírito», parece não haver vizinhos por concorrentes...

11. Nos extremos raianos dos actos rígidos decretados e das rotundas da banalidade onde se cultivam torres de Babel, para além dessa fronteira, começa Portugal.

12. Os nossos olhos deixaram de ver longe, com lucidez, quando se voltaram para um ponto fixo, demasiado fixo. Vimos em demasia a cor e o preço da pimenta, e quantas vezes rejeitámos a temperança, embriagando-nos com o cheiro da especiaria. Aí criámos cataratas que importa retirar.
O nosso mandala deve ser o círculo, ou melhor, a esfera. Nos tempos em que se pressentiu que a fortuna poderia vir a desfazer-se, e quando vimos em demasia o caminho fatídico de expulsão de quem já morava no nosso coração, ainda assim, a melhor herança foi a esfera armilar, para nos lembrar da necessidade quotidiana de olhar o mundo. Diz-se na teoria do mandala que, até que tudo se harmonize, não se deve fixar ponto algum. O olhar deve ser uma totalidade. Só depois encontraremos o ponto central ou, se quisermos, alguma revelação. Em geografia somos periféricos. Espiritualmente, só nos podemos realizar no centro do mundo. Do lado de fora, há que olhar ainda a linha do horizonte.

13. «Se não é eleito, que se eleja!» Foi assim que Agostinho da Silva respondeu à pergunta habitual de quem geralmente cultiva meias-verdades sobre o nosso destino colectivo. Com rompante intuição, ou com sabedoria história, ou o Janus bifronte, o autor de Reflexão teria meditado naquele ponto tão enigmático como misterioso tem sido Ourique: o nosso primeiro Rei, ele próprio se armou cavaleiro, isto é, elegeu-se!

14. Constituição Europeia – a esfinge clonada.

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