sexta-feira, 29 de junho de 2007

A sombra de Eurídice (1)

um soneto de Luís de Camões

Quando a suprema dor muito me aperta,
se digo que desejo esquecimento,
é força que se faz ao pensamento,
de que a vontade livre desconcerta.

E assi, de erro tão grave me desperta
a luz do bem regido entendimento,
mostrando que é engano ou fingimento
dizer em que tal descanso mais se acerta.

Porque essa mesma imagem, que na mente
me representa o bem de que careço,
me faz de um certo modo ser presente.

Ditosa é logo a pena que padeço,
pois que da causa dela em mim se sente
um bem que, inda sem ver-vos, reconheço.

Imagem: retrato de Luís de Camões, por William Blake.

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